terça-feira, 31 de março de 2009

PAINEL sobre DESPORTO E CIDADANIA - as intervenções, em síntese

MT AGUIAR

O dia de trabalhos, a 7 de março, começou com este painel e com uma série de curtas e incisivas intervenções.
É um tema que me acho interessante incluir no programa sobre a participação igualitária das mulheres e que poucas vezes vemos tratar em iniciativas deste género, e, por isso o segui, atentamente, vendo, também, depois, a respectiva gravação.
Na mesa , moderada pelo Dr. Paulo Amaral, dois atletas do FCP, da secção de Bilhar, o Vice-Presidente do Clube, Alípio Jorge e a Drª Joana Silva, campeã nacional, a Profª Doutora Graça Sousa Guedes, também ela antiga campeã nacional de voleibol e jogadora da selecção nacional, e o campeão olímpico de Atletismo, António Leitão.
A Profª Graça Guedes apresentou uma comunicação, que está publicada. Não assim os demais.
Vou procurar, muito sinteticamente, dar conta do que nos disseram.
O Sr. Alípio Jorge, começou por nos lembrar, muito a propósito, que a Secção de Bilhar do FCP não é o melhor exemplo de discriminação da mulher no desporto, antes pelo contrário: ali, há mulheres, seccionistas e dirigentes da Secção, mulheres praticantes e mulheres campeãs, que dão muitos títulos nacionais ao clube!
Mas, noutro país e noutro contexto, referiu impressionantes casos de discriminação da mulher, de que tomou conhecimento através da experiência de vida de uma jovem voluntária em trabalho a favor de comunidades locais. A jovem é a sua própria filha, neste momento, a prestar esse serviço na Índia, em Surate. Aí, sim, as mulheres são sempre relegadas para lugar secundário. Até nas refeições, primeiro é a vez dos homens - o que inclui as crianças, de 5 ou 6 anos, do sexo masculino... - enquanto as mulheres olham, de longe. E, só quando eles terminam, é que se aproximam da mesa.
António Leitão falou como um espinhense muito orgulhoso da sua terra, uma terra de desporto por excelência, onde as pessoas gostam de praticar desporto, e onde os clubes, como o Sporting de Espinho e a Académica de Espinho, têm tido um papel essencial na formação de grandes atletas, em diversas modalidades, como o voleibol e o atletismo. Mulheres e homens! Espinho é um símbolo da aceitação da Mulher, com muitas campeãs, que têm representado Portugal.
No seu caso, começou a dedicar-se ao atletismo, desde muito novo. É um desporto acessivel e atraente, porque não exige equipamentos ou infra-estruturas caros.
A situação era, e, em alguns casos ainda será - embora a evolução recente tenha sido positiva - no interior do País. Há uns anos atrás, não compreendiam, nem toleravam a prática do desporto, sobretudo para as mulheres. Quando treinavam no interior, ele, a Rosa Mota e outras atletas, várias vezes, foram apupados. Fazia muita confusão àquela gente vê-los a correr... Para as mulheres estavam reservadas as piores invectivas. No mínimo, coisas do género: "Vai para casa, lavar a loiça!"
Neste aspecto de mentalidade e costumes, a mudança é enorme: as mulheres são aceites, em termos de igualdade.
António Leitão acha mesmo que, em certas situações, são até mais fortes e considera ter sido um privilégio conviver com tantas campeãs de atletismo.
O desporto ajuda a desenvolver seres humanos mais fortes, do ponto de vista físico e psíquico.
É para todos, o governo tem de apoiar mais as escolas - há ainda muitas que não têm as melhores condições.
E, para fazer campeões, deve construir-se uma pirâmide pela base, com um sem número de praticantes comuns.
Falou, seguidamente, uma atleta, que veio dar inteira razão ao que António Leitão acabara de afirmar, convictamente.
A Drª Joana Silva.
Desde muito jovem praticou educação física, natação, ballet, "volei", e, mais recentemente, bilhar.
Numa linguagem muito directa e espontânea, prestou uma grande homenagem à Mãe, sem a qual nada do que conseguiu teria sido possível, porque a acompanhou, anos a fio, para todo o lado, em deslocações constantes, e ao Pai, ele, também, um antigo atleta, cujo lema era este: "No desporto como na vida!".
No desporto, afinal, de uma forma mais intensa, mais rápida, mais concentrada, aprende-se com as mesma experiências de que a vida se faz - é preciso saber conviver com vitórias e derrotas.
Joana aprendeu no desporto:
a assumir reponsabilidades; a cumprir horários; a aceitar a derrota;
a contruir uma identidade, com dignidade, não por ter ganho ou perdido, mas por ter jogado;
a fazer esforço para se transcender;
a conviver com os outros, que parecem diferentes, mas são iguais;
a ter objectivos colectivos - ajudar e ser ajudado.
E, em especial, no Bilhar habituou-se:
a arrancar sorrisos, quando se apresenta como praticante da modalidade;
a surpreender pelo insólito;
a quebrar estereótipos.
A prática da modalidade pelas mulheres combate, eficazmente, o preconceito quanto ao sexo feminino e quanto à própria modalidade, injustamente associada à imagem de ambientes de alcool e de fumo ( que , na vertente federada, nunca foi verdadeira).
No FCP, a Secção de Bilhar é um exemplo de boa prática da igualdade: a chefe da Secção é uma mulher e às atletas é possibilitada a plena participação nas actividades, na formação de novos talentos, na arbitragem.
As atletas do FCP são tetra campeãs nacionais e orgulham-se de contribuir para dar essa imagem mais positiva da modalidade.
Registei, ainda, do debate, a intervenção da DrªManuela Aguiar, cujas opiniões, neste campo, conheço há muitos anos. Perfeitamente sintonizada - e entusiasmada - com as intervenções que aqui refiro, fez a apologia do "desporto para todos", recusando reservar a expressão "desporto" para a sua vertente profissional, ou de "alta competição".
A prática do desporto, segundo ela, deve ser para todas as idades, para todos os cidadãos.
E é começando pelos mais pequenos, na escola, em competições intra-escolares, que se alarga a base da pirâmide , de que falava António Leitão.
Fomentar o aparecimento de campeões é um objetivo fundamental, mas não é o único.
Uma juventude mais saudável, e mais feliz passa, num país que subvaloriza a importância da actividade física, pela melhor repartição dos tempos reservados ao desporto e às outras matérias curriculares. Se calhar, era preciso duplicar os horários do desporto escolar, criar novos regimes de incentivo ao deporto universitário!
O melhor exercício da cidadania é facilitado pelas qualidades que o desporto desenvolve -por exemplo, o "sentido do colectivo" , salientado pela Joana Silva.
E a prática do desporto para todos deve ser vista como um direito. Para os profissionais e para os amadores, para os que têm talentos raros, e para os outros também.
O prazer de praticar desporto, a utilidade e proveito para cada um, são exactamente os mesmos para os génios e para a gente comum, ainda que o resultado em termos de espectáculo, ou de "performance", o não seja.
O Estado tem de apoiar, com os meios adequados, uns e outros.

2 comentários:

  1. Olhando o meu caso pessoal, situando-me entre os praticantes comuns - tinha lugar na equipa do colégio, em volei ou andebol, mas, certamente não na selecção portuguesa... - confesso que suportei um longo internato de 7 anos, num colégio de religiosas "Doroteias", graças às excepcionais condições que o parque do Colégio do Sardão, em Gaia, nos dava para a prática de vários desportos - do ténis ao andebol. Contando as horas de ginástica curricular - com a D. Margarida Tamegão - os treinos sob orientação de um campeão nacional de várias modalidades - Edgar Tamegão - , e os recreios - tudo somado - eram horas de desporto quotidiano!
    As recordações mais felizes desse meu tempo do colégio são as dos campos de jogos.
    E faz-me pena, quase 60 anos depois, ver que o Estado ainda não assegura à generalidade dos alunos, no século XXI, o que um (muito bom) colégio particular, já então, oferecia a meninas, crianças e adolescentes.

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  2. E, também, por lá, por aqueles recintos do Sardão, se fez uma grande jogadora de volei, que foi da nossa selecção e várias vezes campeã nacional, pelo Sporting de Espinho. E que viria a licenciar-se no ISEF, a doutorar-se na Sorbonne, e a ser a primeira mulher catedrática de desporto, no País.
    Falo da Graça Guedes, obviamente.

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