sexta-feira, 15 de maio de 2020

De ANTÓNIO PACHECO sobre IbrahimioMbaruco

IPLWS at Rhode Island College
RHODE ISLAND COLLEGE
INSTITUTE FOR PORTUGUESE AND LUSOPHONE WORLD STUDIES
  
NOTA DE IMPRENSA / PARA DIVULGAÇÃO IMEDIATA
20 de abril, 2020 
CONTACT:  Sílvia Oliveira, 401-456-8496, soliveira@ric.edu

*Ibrahimo Abu Mbaruco: uma voz suprimida
Testemunho do jornalista António Pacheco
20 de abril de 2020

Nesta semana foi divulgada a notícia de que um radio jornalista, do norte de Moçambique, que trabalha numa rádio comunitária em Palma desapareceu do radar da família, dos amigos e a sua voz foi silenciada. Aparentemente os últimos contactos que fez levaram-no às instalações da polícia de Palma e à procuradoria. 
Cabo Delgado é uma zona riquíssima do Norte de Moçambique e é também uma região flagelada por guerras desde os anos 60 no período da luta pela independência e de novo conflito armado ainda não totalmente esclarecido.
Juntei os dois factos e surgiu-me o conceito de “rádios comunitárias, o poder da voz contra a voz do poder." A expressão deixa entender que as pessoas não confiam mais no que o "poder" dominante diz ou transmite, seja poder de elites religiosas, políticas ou o poder económico. As pessoas estão mais atentas ao poder da sua voz, transmitida pela sua rádio comunitária, criada com o esforço comunitário, com o sacrifício conjunto.
Na África de expressão portuguesa acompanhei o aparecimento e reforço das rádios locais. Na Guiné Bissau conheci o caso da Rádio "Voz de Quelele," a primeira rádio comunitária do país, estabelecida em 1994 pela associação de moradores do bairro do mesmo nome. Em 1997 surgiu uma epidemia de cólera no país e a rádio do estado, a tal voz do poder, escondia os dados nas suas notícias. Pelo contrário, a "rádio voz de Quelele" que era constituída por voluntários jovens, informava e sensibilizava os moradores. Conclusão: Quelele foi o único bairro de Bissau sem um caso de cólera. Este caso é estudado nas escolas francesas como exemplo da importância da "voz" do povo.  
Infelizmente, as rádios do estado no espaço lusófono continuam a ser instrumentos de conflito, mentira e intriga: instrumentos do colonialismo primeiro, tornaram-se depois das independências em "vozes da libertação" ao serviço do clã, do grupo económico, da etnia e até das religiões - também rádios de mentira e de manipulação.
Queria terminar com outra recordação pessoal: Em 1989 e 1990 durante o conflito na Guiné-Bissau havia um programa em Lisboa, chamado "Renascença África" que era transmitido em simultâneo por rádios comunitárias como a rádio Bombolom na Guiné ou a rádio Pax (de Moçambique e que funcionava numa carrinha nas traseiras da Catedral da Beira). No programa entrava um espaço desportivo, a "bola branca". As notícias traziam as últimas informações do futebol europeu pela voz inconfundível do jornalista Ribeiro Cristóvão. E então acontecia o impensável: a guerra parava na Guiné porque rebeldes e forças armadas queriam conhecer as últimas notícias do futebol. E o povo, de rádio em punho, saía então à rua para o reabastecimento necessário. Quando o programa terminava, regressavam aos esconderijos.
Este o sentido para mim de rádios ao serviço do povo e da paz.
Que o nosso amigo radialistaIbrahimo Abu Mbarucodo Norte de Moçambique retorne com a sua Voz para continuar a servir o Povo da sua terra!

*Testemunho pode ser escutado na Radio Sol Mansi (Guiné-Bissau) eRádio Observador (Portugal). RM disponível para partilhar com rádios locais.
Permanent Mission of the Republic of Mozambique to the United Nations:
António Pacheco (Moçambique/Portugal) é formado em Direito pela Universidade Clássica de Lisboa, e foi Secretário-Geral da Fundação Pro Dignitatede Lisboa, onde dirigiu o Projeto Rádios para a Paz em parceria com oInstituto de Estudos Portugueses e Lusófonos do Rhode Island College. Foi co-fundador do Centro de Estudos Africanos da Universidade Eduardo Mondlane, Moçambique, em 1976 (um ano após a independência); tem uma longa carreira de jornalista especialista em temas africanos na Rádio Renascença (Portugal), UN Radio, Canal Africa (South Africa Broadcasting Corporation) e foi correspondente durante 20 anos da Radio France Internacionale. Liderou workshops em radialismo (jornalismo de rádio) nas seguintes rádios comunitárias: Rádio Nova (Cabo Verde), Pax (Moçambique), Ecclesia (Angola) e Sol Mansi (Guiné Bissau).
O poder da voz e a voz do poder: manual de jornalismo: textos para acções de formação. Org. e pref. António Pacheco; textos Amadu Uri Djaló... [et al.]. 2ª ed. - Lisboa : Fundação Pro Dignitate, 2015. 
Workshop "O poder da voz contra a voz do poder."
Rhode Island College, 28 de novembro de 2018.
Estabelecida em 1854, a universidade de Rhode Island College serve aproximadamente 9,000 estudantes de bacharelato e de pós-graduação através das suas cinco faculdades: Faculdade de Artes e Ciências, Faculdade de Educação e Desenvolvimento Humano, Faculdade de Gestão e Economia, Faculdade de Enfermagem e a Faculdade de Serviço Social. Para mais informação visite:www.ric.edu.

Estabelecido em 2006, o Instituto de Estudos Portugueses e Lusófonos é um centro académico não tradicional na universidade do Rhode Island College, com o objetivo de ser um núcleo de interação para benefício dos estudantes de Rhode Island College e da comunidade portuguesa e lusófona de Rhode Island. Para mais informação visite: www.ric.edu/iplws.
Obrigada pela atenção,

Dr. Sílvia Oliveira, Directora
office: 401-456-8496
Institute for Portuguese and Lusophone World Studies at Rhode Island College
Sylvan R. Forman Center, 201
Providence, RI 02908