terça-feira, 27 de dezembro de 2011

COMUNICAÇÃO DE ARCELINA SANTIAGO

Dia 26 de Novembro de 2011– 11.15 h
O Congressismo e as Políticas de Género na Emigração
Liderança e Participação - enfoque para a participação das mulheres na vida política - Arcelina Santiago

Começo por saudar todos os presentes e, em especial, os membros da mesa. Acrescentaria apenas à apresentação tão simpática que foi feita pela moderadora deste painel, Professora Drª Joana Miranda, a dimensão que mais marcou o meu percurso como cidadã da diáspora e que toca três continentes: o asiático, o africano e o europeu e que, se por um lado, não me deu uma forte ligação a um lugar, por outro, deu-me um forte sentido de compreensão e valorização das diferentes culturas. Agradeço e dou os parabéns por esta iniciativa à Associação Mulher Migrante e às suas Presidentes (Conselho Geral e Direção), verdadeiros exemplos de mulheres na liderança.
Começarei por fazer um breve revisitar do passado, apenas porque ele é importante para perspetivar o futuro.
Da proclamação da República até à actualidade, longe vão os primeiros Congressos das mulheres feministas em Portugal, já que eles aconteceram em 1924 e 1928, respetivamente, o I Congresso Feminista e de Educação e o II Congresso Feminista, já no Estado Novo.
Na verdade, a chegada da República não trouxe mudanças para a situação das mulheres que, já então, se mostravam lutadoras dos direitos das mulheres. Exemplo disso, temos as histórias das mulheres da República, patente na exposição,que faz parte deste Encontro, de entre as quais destaco Maria Lamas e Maria Archer, nossas homenageadas neste Encontro. Destaco um episódio ocorrido, faz este ano cem anos e que tão pouco revelo teve por parte dos media. Celebrou-se, no dia 28 de Maio, o centenário dum significativo episódio que marcou a história do feminismo em Portugal. Tratou-se de um ato corajoso de uma mulher notável - Carolina Beatriz Ângelo, a primeira mulher a votar no quadro dos doze países europeus que vieram a constituir a União Europeia (até ao alargamento, em 1996). Pelo fato de ser médica, mãe e cabeça de casal, apresentou-se na secção de voto para exercer esse direito na eleição da Assembleia Constituinte, acompanhada por elementos da Associação da Propaganda Feminista. Tratou-se de um grande passo que acabou por ser apenas simbólico e marcante de um longo caminho, a nível nacional e mundial que estava ainda para ser trilhado, na luta pela cidadania e pela emancipação das mulheres.
Foi longa, muito longa esta caminhada! O sufrágio universal só acontece com o 25 de Abril, onde foram, finalmente, abolidas todas as restrições à capacidade eleitoral dos cidadãos tendo por base o género.
A conquista dos direitos tem sido feita de forma lenta, mas nem por isso as mulheres desistiram. Elas têm um longo percurso de associativismo e participação desde a criação da Associação de Propaganda Feminista, passando pelo Conselho Nacional das Mulheres à Cruzada das Mulheres Portuguesas, esta fundada por Ana de Castro Osório. Foi preciso passarem 3 décadas da 1ª participação das mulheres na Assembleia Nacional (1935) até à nomeação da primeira mulher ministra, Maria de Lourdes Pintassilgo na pasta dos assuntos sociais.
Nesta caminhada, aconteceram retrocessos como a extinção compulsiva do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas (1948) na sequência de uma grande exposição de livros escritos por mulheres, com colóquios e sessões de discussão, em Lisboa. É nessa altura publicado o livro As Mulheres do meu País, de Maria Lamas, que, tal como Maria Archer, fizeram a sua luta pela escrita.
Longe vai também a subscrição de Portugal nas Nações Unidas da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1949) e da Constituição (1976) que estabelece a igualdade entre homens e mulheres em todos os domínios., mas o grande impulso da participação das mulheres na política só acontece com a Lei Orgânica nº 3/2006, de 21 de Agosto, Lei da Paridade, que estabelece que as listas para a Assembleia da República, para o Parlamento Europeu e para as autarquias locais são compostas de modo a assegurar a representação mínima de 33% de cada um dos sexos. Decorridos cinco anos sobre a entrada em vigor da presente lei, esperamos que a Assembleia da República avalie o seu impacto na promoção da paridade entre homens e mulheres e proceda à sua revisão de acordo com essa avaliação.
Mais de quatro décadas após a aprovação da Constituição que eliminava todas as formas de discriminação contra a Mulher e quase 16 anos depois da adoção da Plataforma de Acção de Pequim - dois dos mais importantes e recentes avanços em igualdade e direitos das mulheres, ainda há sérias desigualdades com base no género. A participação das mulheres na política e nos postos de decisão continua a ser uma das áreas que se podem considerar críticas na situação portuguesa. Também o fenómeno da pobreza não é neutro, atingindo particularmente as mulheres. Para tal contribui a especificidade da sua participação na vida familiar, económica e social: auferem em média salários mais baixos, são mais afectadas pelo desemprego, tem menos protecção social devido a uma participação mais irregular na actividade económica; por outro lado, com a maior esperança de vida, comparativamente aos homens, as idosas encontram-se muitas vezes em situações precárias, quer do ponto de vista dos recursos económicos, quer pelo isolamento em que vivem. Outro grupo particularmente afectado por situações de pobreza e o das famílias monoparentais de que são responsáveis, maioritariamente, as mulheres.
Estes problemas não são apenas a nível nacional, mas de âmbito internacional e atingem todas as mulheres e, particularmente, as mulheres na diáspora.
Através do Observatório da Emigração, constatámos que há emigrantes portugueses que ocupam lugares de liderança na área política, por exemplo, há 3500 autarcas de origem portuguesa em França, mas não há um registo preciso de quantas mulheres. Só conhecendo a realidade se pode dar o devido valor, apostar nas mudanças, dar apoio de acordo com as necessidades. Sabemos que o perfil dos novos cidadãos da diáspora é agora diferente, mas é importante conhecer, ao certo, o número dos emigrantes, recolher informações precisas sobre eles, conhecer e divulgar as suas histórias de vida, dando-lhe o devido protagonismo, que tanto tem sido descurado, quando eles são verdadeiros embaixadores da lusofonia. Relativamente às mulheres, há que aprofundar o seu universo, numa perspetiva psicológica neste processo migratório. A aposta e reforço no ensino da língua será uma das melhores formas de manter uma ligação estreita entre os luso-descendentes às suas raízes e, neste aspeto, as mulheres têm tido um papel extraordinariamente importante, como defensoras e divulgadoras da língua e da cultura portuguesa além fronteiras. Elas são um grande capital da lusofonia e, por isso, elas poderão ser, nesta situação de crise as grandes mobilizadoras de mudanças,. Será talvez uma oportunidade para reconhecer a contribuição das mulheres para a economia, a cultura e para a intervenção social e política.
Poderemos questionar: que políticas tem havido no sentido do empoderamento e incentivo às mulheres da diáspora para que elas assumam papéis de liderança? Que medidas têm sido tomadas para que elas tenham representação nos órgãos políticos? Estamos certos que muitas medidas ainda não foram aplicadas e que muito há para ser feito nesta caminhada que já vai longa…
Deverá haver: uma maior ligação e relacionamento entre as comunidades portuguesas e entre estas e Portugal, colocando-se na agenda do dia problemas que afetam as suas realidades, trocando-se experiências e incentivando-se as mulheres para papéis de liderança; maior incentivo à participação dos jovens nos movimentos associativos, aproveitando-se as novas tecnologias de informação e comunicação e introduzindo neles o principio da paridade nos órgãos de direção; maior representação de emigrantes (mulheres) nos órgãos de poder e decisão; melhor gestão da diáspora e promoção da democracia paritária no processo de eleição de deputados e eleição dos conselheiros das comunidades; aplicação de ações positivas para conciliação da vida profissional com a vida familiar; aplicação do empoderamento das mulheres migrantes para que possam desenvolver as suas capacidades para colectiva e individualmente controlarem as suas vidas, identificarem as suas necessidades, estabelecerem as suas próprias agendas e solicitarem apoio e respostas do Estado e da comunidade aos seus interesses.
Deixo, por fim, um alento e incentivo às mulheres migrantes na sua caminhada pela defesa da igualdade de direitos, certa que as dificuldades serão sempre muitas mas as protagonistas das mudanças somos nós, as mulheres, juntamente com os homens. São muitas as diferenças que separam homens e mulheres, mas são mais numerosos os desafios que nos unem: transformar a sociedade, atingir um desenvolvimento económico e social mais justo neste mundo globalizado e superar os obstáculos que impedem a igualdade.
Arcelina Santiago

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