domingo, 18 de janeiro de 2015

Manuela Aguiar na Sorbonne - intervenção no colóquio

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INTERVENÇÃO NO COLÓQUIO

Em 2014 a programação da AEMM propõe um olhar sobre a Revolução de Abril de 1974, sobre o seu significado  e virtualidades na área das migrações. À revolução ligamos, naturalmente, uma palavra:
liberdade! Liberdade para todos os portugueses, mulheres e homens, liberdade para os emigrantes, os que já o eram e os que o queriam ser - uma realidade nova, em rotura definitiva com o passado, porque, de facto, a saída do país nunca fora, ao longo de mais de quinhentos anos, inteiramente livre. As mais antigas e persistentes políticas neste domínio iam todas no sentido de condicionar ou proibir um êxodo continuado em sucessivos ciclos, quase sempre visto como excessivo, sobretudo quando envolvia mulheres ou famílias inteiras. A
Constituição de 1976 ao proclamar a liberdade de circulação através das fronteiras do país, expressamente englobando o direito de partir e o direito de regressar, estabeleceu um precedente histórico, numa
história multissecular. (1) Precedente constitucional de igual alcance é o reconhecimento de direitos políticos e a imposição ao Estado de obrigações para com os portugueses do exterior, no articulado da CRP de 1976 ao garantir que" os cidadãos portugueses que se encontram ou residam no estrangeiro gozam da protecção do Estado para o exercício dos direitos e estão sujeitos aos deveres que não sejam incompatíveis com a ausência".(2)
A interpretação do conceito de "incompatibilidade" foi evoluindo no sentido do alargamento de direitos,  ao ritmo dos compromissos politcos possíveis. Os obstáculos não eram de natureza técnico-jurídica, visto que o direito comparado oferecia já, no que a sufrágio nos diversos  processos eleitorais respeita, modelos muito
concretos do seu fácil exercício.   .
Em Portugal, depois de aceite o voto dos emigrantes para a AR em
1976 (3) foi preciso esperar 23 anos pelo direito de voto para o PR. e
nos referenda. Do mesmo modo, após a adesão do País à CEE em 1985,
houve que aguardar quase duas décadas para que os cidadãos europeus
não residentes na Europa da União pudessem participar na eleição do PE
(uma opção que é pelos Tratados deixada aos Estados
membros...):Delongas semelhantes retardaram a restituição da
nacionalidade com efeitos retroactivos -no período que vai da
promulgação  da Lei nº 73/81 à entrada em vigor da Lei  nº 1/ 2004 (
mais de 22 anos)
Estava, apesar de tudo isto, adquirida, ao nível dos princípios a
ideia da igualdade de direitos entre os portugueses, dentro e fora do
País, Ao Estado
incumbia, desde 1976, desenvolver políticas de protecção dos cidadãos no
espaço transnacional, assegurando o acesso ao ensino e à cultura,  à
informação, o acompanhamento de situações de vida, a participação
política . .
A democracia passara a ser concebida à dimensão nacional, e iria sendo
aprofundada na transição do "paradigma territorialista" para o
"paradigma personalista", centrado na pessoa, nos cidadãos, com
direitos individuais, no seio de uma comunidade nacional que extravasa
fronteiras. Foi o fim de um dogma que se impusera, com carácter
absoluto, em nome da soberania territorial do Estado.
Subsistiam, como dissemos, condicionalismos restritivos, estávamos e
continuamos num processo evolutivo, inacabado - aquém de exemplos
dados, em particular pelos países do sul da Europa, com os quais temos
as maiores afinidades – mas há, de facto, um "antes" e um "depois" do
25 de
Abril:
antes, os emigrantes sofriam uma verdadeira "capitis diminutio",
perdendo, ao fixar residência no estrangeiro, todos os direitos
políticos, a nacionalidade, se adoptassem voluntariamente a de outro
país (no caso das mulheres, automaticamente, pelo casamento com
estrangeiros), assim como direitos sociais e culturais
 depois, os emigrantes são reconhecidos como cidadãos, agentes da
cultura e da história portuguesas, na geografia universal.

 OS DIREITOS DE PARTICIPAÇÃO POLÍTICA


Eleição para a AR

Com o progressivo alargamento de direitos políticos se vai construindo
uma  cidadania de iguais", nas comunidades do interior e do exterior,
erradicando os vestígios do "paradigma territorialista" - que ainda os
há, não obstante a CRP de 1976 proclamar que "todos os cidadãos têm o
direito de tomar parte na vida política e na direcção dos assuntos
políticos do país, directamente ou por intermédio de representantes
livremente eleitos". (4)
Aos portugueses emigrados é concedido, de imediato, o direito de voto
para Assembleia da República, mas, note-se, não com um “voto igual”….
De facto, a Lei Fundamental  restringe aos círculos territoriais a
aplicação do sistema proporcional, permitindo impor, na lei eleitoral,
um tecto de apenas quatro representantes em dois círculos da
emigração, europeia e transoceânica (correspondendo a menos de 2% do
total de dos deputados, para uma população que se estima em 30%,
embora, há que dizê-lo, seja bastante inferior a estimativa realista
de potenciais recenseados no estrangeiro...). Para as eleições do PR
(5) e das Autarquias locais (6), a Constituição de 1976 exige a
residência no território nacional. Para as regiões autónomas, não
havendo estatuição semelhante, os respectivos estatutos político -
administrativos permitem a iniciativa regional neste domínio, sendo,
porém, a deliberação final da competência da AR. O impasse mantém-se e
não parece fácil, no futuro próximo chegar à necessária maioria, no
hemiciclo de São Bento…

Eleição do PR
O sufrágio na eleição presidencial viria a ser alcançado, em Portugal,
no meio de públicas controvérsias e difíceis negociações inter
partidárias, na revisão Constitucional de 1997, com a especial
exigência de comprovação da,"existência de laços de efectiva ligação à
comunidade nacional". (7). Como desde então, defendi, o acto
voluntário de recenseamento é a mais evidente prova da subsistência
desses laços (7ª). Todos os outros critérios aventados se revelaram de
tal modo desajustados e discriminatórios de determinadas categorias de
emigrantes, que, ao fim de anos de adiamentos e de debates, se acordou
no requisito único de uma inscrição voluntária nos cadernos eleitorais
abertos nos consulados…

Os “referenda” nacionais
Mais restritiva é, ainda, a norma, que prevê a sua participação nos
"referenda" apenas "quando recaiam sobre matéria que lhes diga também
especificamente respeito” (8). Até hoje, a AR, sempre  decidiu, por
maioria, exclui-los dos processos referendários em concreto.

Eleição do PE
O direito de voto nas eleições para o Parlamento Europeu fora do
espaço da EU (deixado, como disse, ao arbítrio dos Estados Membros)
só veio a ser admitido em 2004, com a aprovação de uma proposta de
lei, da qual fui a primeira subscritora. (7b), quase duas décadas
depois de uma proposta de lei do Governo, votada por maioria na AR,
logo após a adesão à CEE, em 1985, ter sido objecto de declaração de
inconstitucionalidade, suscitada pelo PR (  )

Um estatuto em evolução

Não poderei alongar-me sobre as vicissitudes destes processos, em que
tive intervenção ao longo de mais de 20 anos, sempre, em favor do
alargamento do estatuto político dos expatriados, a nível nacional,
autonómico e autárquico, com base no direito comparado, em particular
o ordenamento jurídico espanhol, que atribui aos emigrantes direitos a
todos esses níveis. Direi, apenas, em síntese que, a meu ver, os
nossos partidos actuaram, regra geral, de acordo com as suas
expectativas sobre o sentido de voto dos emigrantes. Os que se viam
como menos favorecidos, desenhavam o cenário fatal de uma enorme
expansão do eleitorado do estrangeiro, artificialmente engendrada
pelos partidos mais beneficiados pelo voto nos círculos da emigração.
Ao fim de 40 anos de experiência democrática já não restam dúvidas
sobre o irrealismo do prognóstico: no estrangeiro o universo eleitoral
é reduzido e estável - cerca de 260.000 recenseados e há cada vez
menos votantes (9) Creio que o clamor sobre a anunciada avalanche de
votos "de fora", que, obviamente, redobrou a partir da aprovação da
Lei nº 73/81, a popularmente chamada "lei da dupla nacionalidade",  se
ficou a dever a confusão entre emigração recente  , de nacionais com
passaporte português, e as várias gerações de descendentes de
portugueses -  a Diáspora, neste sentido, em que o conceito  entrou na
linguagem corrente - cuja ligação ao País passa por laços afectivos e
pela intervenção cultural, não pela política.

O Conselhos da Comunidades Portugueses (CCP)

O “Conselho” é um órgão de consulta do governo e de representação
específica dos portugueses do estrangeiro – a única instituição criada
para a audição dos expatriados, e que se situava na confluência dos
espaços da lusofonia ou lusofilia, nascidos dos movimentos migratórios
– dos mais remotos aos mais actuais
O CCP pretende ser um instrumento de relacionamento democrático entre
Estado e sociedade civil, apelando à co-participação nas políticas
destinadas ao um universo vasto e heterogéneo, composto pela emigração
antiga, com a força das suas aspirações e projectos
culturais e pela mais recente, com os seus problemas laborais e
sociais, económicos. Esta última acabou por ter mais visibilidade e
mais voz, dificultando os consensos naturais no domínio cultural - que
é sempre, o terreno de uma solidária partilha das raízes matriciais –
ao colocar o enfoque em questões do quotidiano, e, inevitavelmente, em
divergências ideológicas e partidárias, que, fora como dentro do país,
se confrontavam na sociedade portuguesa. Exemplo de vivência
democrática, o Conselho deu de si, desde o início, nas reuniões
plenárias e regionais - quando não nos Conselhos de País, que formavam
a base mais homogénea da pirâmide -  uma imagem mediática de
conflitualidade,  sempre mais salientada do que os consensos
alcançados em muitas das matérias fundamentais (17). Essa imagem de
radicalismo pode ter influenciado a decisão do Governo, tomada em
1988, de suspender a ·convocação das sessões plenárias e a posterior
formação de um Conselho policêntrico,
com vários colégios eleitorais, que não chegaram verdadeiramente a
funcionar (18)
.Em 1997, o CCP ressurgiu em figurino completamente diverso. Passou a
ser eleito por sufrágio directo e universal, isto é, restrito aos
emigrantes com nacionalidade portuguesa, num universo muito menor do
que o da Diáspora e perde as suas raízes associativas, tal como a
organização vertical, isto é, as estruturas a nível de comunidades,
por área consular, e as reuniões por grandes regiões (Europa, América
do Norte, América do Sul e
África).
O Conselho teve, pois, uma vida feita de várias vidas entrecortadas,
num percurso mais acidentado do que outros organismos semelhantes
existentes na Europa. Mas resistiu, e será hoje mais fácil do que já
foi impor-se como grande forum democrático. Poderá vir a ser,
idealmente, uma segunda Câmara, de carácter consultivo e
representativo, uma "assembleia" dos portugueses do estrangeiro -
título que passou a assumir o antigo "Conséil" francês.
A hipótese de o CCP ser integrado na arquitectura constitucional foi
debatida na AR, em 2004, por iniciativa da Sub- comissão das
Comunidades Portuguesas (  ). Ao longo da última década a ideia não
foi retomada, mas está em discussão na AR uma reforma legislativa, que
reequaciona a organização do Conselho por país e por regiões.
No que respeita a mecanismos deste tipo, que têm conhecido sido
objecto de grande atenção, a nível internacional, outras reformas
ambiciosas se devem ir pensando, não para que aconteçam de imediato,
mas para que possam germinar no seu tempo certo. Por exemplo,
projectando uma segunda organização, mais ou menos ligada ao CCP, de
índole fundamentalmente cultural, voltada para a Diáspora portuguesa
ou, mais latamente, as diásporas da CPLP

 NOVAS POLÍTICAS

Em 1974 o governo não partia do zero, pois incorporava na Secretaria
de Estado da Emigração as estruturas preexistentes do Secretariado
Nacional da Emigração. Por isso, no que respeita a meios materiais não
terá sequer havido, no curto prazo, uma grande alteração do "status
quo" (  ) – os progressos ficam sobretudo a dever-se a uma maior
consciência dos deveres de um Estado democrático para com os seus
nacionais fora de fronteiras e a um incremento da negociação de
acordos bilaterais e de contactos e reuniões com os governos dos
países de destino da nossa emigração.
O estatuto dos expatriados emerge na afirmação de direitos políticos,
na admissão da dupla nacionalidade, na compreensão dos direitos de
cidadania extensivos às vertentes culturais e sociais., na preocupação
de respeitar, igualmente, as opções de regresso ou de integração
definitiva n e de as acompanhar, com medidas de apoio.

Na segunda meia década de 70 e em 80, são prioritárias as medidas de
facilitação do regresso, num período em que este decorria em números
impressionantes (mais de meio milhão até 83/84 e continuando até ao
final da década ao ritmo de cerca de 30.000 anualmente). O ter sido
quase invisível a sua dimensão real aos olhos da opinião pública,
ainda traumatizada pelo dramático retorno de África em 74-75, revela a
tranquilidade da sua preparação livre e voluntária e o bom uso dos
recursos colocados ao dispor de cada um (empréstimos a juro
bonificado, contas de poupança crédito para investimentos, isenções
fiscais e alfandegárias…)

A política de ensino da língua, com uma enorme concentração de
recursos na Europa, parece ter sido planeada mais na perspectiva do
regresso do que no da expansão do português em comunidades integradas
no país de destino. (só em data recente se manifestando a intenção de
igualizar o acesso à aprendizagem da língua e cultura nos vários
continentes, apesar da CRP, a partir de 1982, considerar obrigação do
Estado garantir esse acesso sem discriminação geográfica…)

O mesmo se diga no sector da informação – o magro orçamento da SEE
para acção cultural era em boa parte dirigido para canais de
programação étnica da França e Alemanha – só a partir de 1980 se
verificando a preocupação de chegar com noticiário, via telex e com
conteúdos áudio visuais aos media de comunidades europeias ou
transoceânicas, por igual. Na década de 90, o investimento na RTPI foi
o maior jamais feito pelo Estado para a emigração



Idêntica situação de favorecimento das comunidades próximas se
constatava no que concerne a incentivos a actividades associativas –
limitadas a subsídio distribuídos por comissão constituídas junto aos
canais diplomáticos daqueles dois países de grande emigração
continental. A constituição do CCP é já um índice claro, não só da
maior importância dada ao associativismo, como de uma visão global das
comunidades espalhadas pelo mundo (só 1/3 dos seus componentes era da
Europa, em correspondência com a grandeza relativa das comunidades e,
naturalmente, com a dimensão das instituições que as compõem.

O mais relevante é, certamente, uma mudança de atitude do Estado, a
sua vontade de admitir que, ao longo dos tempos, as associações se
substituíram aos governos em todos os domínios, da assistência social,
à preservação e expansão da língua e da cultura e que, por isso, todos
os programas de acção que se proponha levar a cabo são enormemente
potenciados pela parceria com estas organizações, tão capazes de
viabilizar contactos, de fornecer informação, de ceder instalações, de
agir empenhadamente, colaborando com enorme espírito cívico.
Foi no quadro desta cooperação com o associativismo e com o seu órgão
representativo, o CCP, que tiveram o seu início as políticas de
género, com a convocação, em 1985, do 1º Encontro Mundial de Mulheres
do Associativismo e do Jornalismo, que, todavia, só teria sequência
duas décadas depois, sempre em cooperação com ONG’s, como a AEMM, nos
“Encontros para a Cidadania - a Igualdade entre Mulheres e Homens, de
2005 a 2009, nos Encontros Mundiais de 2011 e 1013 e em diversas
outras manifestações do que designamos por “congressismo”).

O reforço dos laços inter geracionais, o chamamento dos jovens à
participação cívica no âmbito das suas comunidades, tornou-se uma
prioridade, pela mesma altura, e teve mais sequência mais consistente
nas preocupações de sucessivos executivos. a demonstrar a consciência
de que é essencial ajudar a transformação da emigração em cada novo
tempo –sobretudo a emigração sem regresso… - na diáspora futura....
Actualmente, o declínio, em muitas comunidades, deste associativismo
tradicional, a par da extinção de estruturas autónomas da SECP, de que
adiante falaremos, prejudicará, a não haver um volte face, o
ressurgimento dessa conjugação de forças numa conjuntura de crise,
de um, desmesurado movimento migratório, cuja primeira diferença face
ao passado, é a heterogeneidade, nas qualificações e na facilidade de
integração, grande para alguns, dramaticamente falhada para outros
formas de exploração ou de sub aproveitamento profissional. (12)
Um dos factores que pode contribuir para um volte face, certamente na prática, a
promoção da igualdade de género nas comunidades do estrangeiro, O
dever do Estado de prover o acesso das mulheres à “res publica” é
explicitamente proclamado pela CRP, na revisão de 1997 (14), mas foi,

As iniciativas para a juventude, muitas das quais seguem, igualmente,
uma estratégia de aproximação e sensibilização, que passa por
encontros no e com o país, na linha que poderemos chamar de
"congressismo", assim como por acções de formação e incentivo a novas
formas de associativismo.
São estes alguns dos grandes objectivos que se tornaram praticamente
consensuais nesta área da governação. Mas é óbvio que não foram
levados a cabo por sucessivos governos com a mesma ênfase e que não
conseguiram sempre o mesmo grau de consecução. É inegável o progresso
que representa a assunção pelo Estado das suas responsabilidades para
com os expatriados, mesmo quando não consegue dar-lhes perfeita
execução nas várias fases do ciclo migratório, mas, num período de
êxodo crescente, é uma tremenda constatação, verificar que já foram
muito mais os meios para atingir aqueles fins.

NOVOS MEIOS INSTITUCIONAIS

A SEE foi instituída em 1974  no âmbito do  Ministério do Trabalho, um
enquadramento que, tal como o do SNE no Ministério das Corporações e
Segurança Social, revela  a prioridade dada à emigração recente, ou
seja, à problemática social e laboral de uma primeira geração de
emigrados. A transição da SEE para o MNE, não se deve
a uma alteração desse primado, mas sim a uma procura de melhor
articulação com a rede diplomática e consular
O posicionamento no organigrama de um Executivo é sempre sintomático:
das escolhas fundamentais -  a opção pelo Ministério do Interior
indicia a preocupação de controlo das fronteiras e dos
fluxos·migratórios,   tal como, por exemplo uma possível integração no
Ministério da Cultura -solução experimentada pela Grécia -  patenteia
a prevalência de um olhar para a Diáspora..
Mas, qualquer que seja a sede institucional das políticas para as
comunidades do exterior, é indispensável que sejam desenvolvidas num
eixo interministerial, apelando ao conjunto dos departamentos da
administração pública, muitos dos quais não têm exacto conhecimento da
realidade da vida dos cidadãos no estrangeiro. Por isso, o que os dos
serviços da emigração não podem resolver directamente, tem de ser
articulado com outros, num trabalho incessante de sensibilização. As
competências próprias daqueles serviços, têm variado, ao longo destes
últimos 40 anos, o mesmo se podendo dizer da sua organização interna,
onde assistimos a um movimento pendular ora no sentido de dar forma a
mais departamentos especializados, ora no sentido de os unificar, com
o expresso propósito de conseguir um melhor relacionamento entre as
várias componentes, as de perfil mais burocrático - regulamentação
jurídica, estatística,
informação sobre condições de saída e retorno, acompanhamento de
situações concretas, negociação de acordos, inicialmente a cargo da
Direcção-geral da Emigração – e as mais voltadas para a acção
cultural, prosseguidas, até 1980, pelo Instituto da Emigração, dotado
de autonomia administrativa e financeira. Nesse ano, Direcção Geral e
o Instituto de Emigração foram fundidos no Instituto de apoio à
Emigração e Comunidades Portuguesas (15)  O IAECP, para além de
impulsionar as Delegações no estrangeiro – quase todas posteriores a
1974 - iniciou o processo da sua regionalização, em delegações abertas
através de protocolos com
Câmaras ou Governos Civis, de norte a sul do País. A partir de 1985, o
IAECP, no âmbito das suas funções, sedeou na Delegação do Porto (que
já existia antes de 1974), um "Centro de Estudos", com enfoque nas
migrações de regresso. Em simultâneo, foi lançada uma linha editorial
e iniciada uma recolha de dados num "Fundo Documental e Iconográfico
das Comunidades Portuguesas", pensado como o primeiro passo para a
criação de um futuro  museu da emigração.
 O IAECP foi extinto, na década de 90, e os seus departamentos,
integrados na Direcção-Geral de Assuntos Consulares e Comunidades
Portuguesas (DGACCP). Esta fusão implicou a perda definitiva da
autonomia administrativa e financeira e dos cargos de chefia foram
progressivamente afastados funcionários especializados nas matérias da
emigração. .A mais importante alteração posterior foi a centralização
no MNE, no âmbito do Instituto
Camões, do ensino de português no estrangeiro, em todos os seus
níveis. É o exemplo de um centro de decisão que mudou de um ministério
sectorial. como o da Educação, para o MNE. Modelo contrário se nos
oferece no domínio da informação, onde o MNE fica à margem das
decisões tomadas na programação da RDPI e da RTPI. Exemplo de uma 3ª
via – decisão conjunta do MNE e de outros ministérios, é a que se
impôs em matéria de segurança social (ASIC).
Um feixe de soluções diversas, que, com poucas alterações, vem das
origens dos serviços em 1974e que não será fácil – nem porventura
desejável – revolucionar. A melhor solução está na boa articulação de
políticas, a nível de uma comissão interministerial, a funcionar ao
mais alto nível da decisão.
Exemplo de uma eventual reforma de que se fala e que me parece de
duvidoso alcance é a da criação uma estrutura comum para as políticas
de emigração e Imigração.
Depois de um processo de indiferenciação das questões da emigração num
grande ministério, sem manifesta vocação social ou assistencial, uma
segunda diluição num departamento que se ocupe, em simultâneo dos
problemas dos estrangeiros em Portugal e dos portugueses no
estrangeiro, seria certamente muito complicado de gerir e levaria,
provavelmente, a acentuar a subalternização dos meios afectos às
políticas de emigração, onde o investimento, sempre insuficiente, foi
perdendo, mais e mais, quer, dentro do MNE, para o sector da
ccoperação com África, quer, no interior do governo, para o pelouro da
imigração.

 Se ao nível dos princípios de defesa dos direitos e interesses dos
migrantes a harmonização se impõe (dar aos estrangeiros o que queremos
que outros Estados dêem aos nossos nacionais…), já assim não é ao
nível dos meios operacionais com que os Governos agem no seu próprio
território e no estrangeiro.
As medidas com que tentamos vencer a distância geográfica, lidar com
situações de uma enorme diversidade, em diálogo com os emigrantes e as
suas organizações e com diferentes interlocutores internacionais,
colmatando falhas de outros sistemas quando ponham em causa a
segurança dos nacional, respondendo aos seus problemas concretos, são
de uma enorme complexidade e exigem especialização crescente dos
serviços. É preciso, sim, reforçar os meios institucionais da
Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, recriar delegações
externas, em países, onde a dificuldade se avolumam, nomear
Conselheiros e Adidos Sociais, onde uma austeridade mal direcionada os
eliminou dos quadros das Embaixadas. Este é um domínio onde as boas
soluções para o futuro se podem inspirar nas lições dos anos que se
seguiram à revolução, quando se procurou construir uma democracia
inclusiva dos Portugueses do mundo inteiro.




NOTAS

(1) Nº 1 do art 44 (2) Art. 14 (3) Nº 2 do art 152 (4) Nº 1 do art. 46
(5) Art 124 (6) Nº 1 do art. 246, no que concerne às freguesias e art
252 no respeitante aos municípios (7)Nº 2 do art.121
(8)Nº 2 do art. 115 (9) A comparação com o caso espanhol é
impressionante: só a Galiza tem
quase o dobro de eleitores, e taxas de abstenção excepcionalrmente
baixas, considerando o universo europeu da emigração  .(10) Nos termos
da alínea j) do art.74 da CRP, o Estado deve “assegurar aos filhos dos
emigrantes o ensino da língua portuguesa e o acesso à cultura
portuguesa"-. Os governos têm dado, porém, um cumprimento parcial e
desigual em diversos países e continentes a esta estatuição.
Inicialmente o esforço concentrou-se na nova emigração na Europa,
deixando as comunidades transoceânicas entregues a si próprias, ao seu
dinamismo associativo, que foi enorme. A intervenção do Estado
estendeu-se, em inícios de 80, à África do Sul. Actualmente a
tendência é para uma maior distribuição de meios, criando novos
apoios onde não existiam, deixando, porém, o ensino de ser
inteiramente gratuito na Europa

(11)
(12)  Os primeiros organismos criados para este objetivo foram de natureza
semelhante às atuais comissões interministeriais, embora com outra
designação: no primeiro quartel do
século XX, sem historial relevante, o "Comissariado da Emigração", e,
em meados do século (1948), com vida
ativa mais longa e eficaz, a "Junta de Emigração", sedeada no
Ministério do Interior - sede adequada a um organismo que se propunha,
antes de mais, o controlo dos movimentos migratórios, o  recrutamento
e acompanhamento da saída dos portugueses. Á "Junta" sucedeu o
"Secretariado Nacional da Emigração", mais centrado proteção dos
cidadãos no estrangeiro e de apoio às atividades culturais do
associativismo.

(13) A audição das mulheres e o impulso à sua participação cívica
foi retomada com os "encontros para a cidadania" (2005 2009),  dos
quais a AEMM foi um dos principais co-organizadores, por parte da
sociedade civil. Foi e continua a sê-lo. Com o atual governo, no mesmo
espírito têm sido desenvolvidas iniciativas múltiplas para a
igualdade, fundamentalmente em diálogo c om ONG's
(14)
(15) numa altura em que, além da DGE e do IE, existiam de jure,
embora não de facto,  mais duas instituições, o Instituto de Apoio ao
Regresso e o Fundo de Apoio às Comunidades a opção foi a de caminhar
para a unificação, no IAECP, que manteve  a ampla autonomia do IE e
reuniu em si todas as competências daquela panóplia de serviços..
(16)  20 anos depois de um 1º encontro mundial de mulheres no
associativismo e no
jornalismo, realizado em 1985  - em termos europeus, uma iniciativa
18) O fim do IAECP implicou a perda de uma margem de autonomia
essencial na área das comunidades portuguesas, dentro do universo do
MNE... Com esta afirmação, não é no poder e competências do
responsável político que estou a pensar, mas nos meios operacionais de
que dispõe, no desaparecimento de  departamentos e de chefias
próprias, com especialização, vocação

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