segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Filomena Fonseca Poemas


OS VELHOS DA MINHA RUA       

 Abandonado nas máquinas e ferramentas
secou de vez o suor deixado
na fábrica fechada.
Pés cansados e gastos
já não sabem correr.
Calejadas as mãos trémulas
seguram tristes bengalas.
Mirrados no corpo e nas reformas
olham o céu
e esperam o tempo.

À porta de casa
sentados
abraçam o cair da noite e
sozinhos
jantam saudades.
Os velhos da minha rua.

 

DESVALORIZAÇÃO
Nas aldeias
às vezes sem dormir
as mulheres esfregam o soalho
limpam a casa
pensam o gado
cosem a roupa
lavam os filhos
e cozinham exaustas...
Às vezes
os homens
esquecem-se delas
outras vezes
vingam-se
de cansadas querelas.

 
POEMA DE AMOR PARA O MUNDO
Queria escrever para o mundo um poema de amor.
Saio em busca das palavras.
Sei do amor de Camões pelas musas inspiradoras.
Do amor eterno de Romeu e Julieta. Do amor de Pessoa por Ophélia e
do amor à arte num tempo infindo de Manoel de Oliveira.
E sei do amor no sorriso de um velho abraçado. Na lágrima da mãe ao ver o filho pela primeira vez. 
O amor tem olhos frontais e limpos. É uma junção de gestos e afetos.
Um embalar da vida. Um matar de saudades.
O amor dá, ri, brinca, chora e anima. Veste o corpo com a pele do outro.
Abre os braços ao vento sem olhar o tempo.
E deixa rasto positivo de tudo e de nada. 
Alexandre O`Neill disse que “Amor não há feito. É coisa mental”.
Há quem escreva só poemas de amor p´ra viver sempre com o amor
nos poemas. E já tudo foi dito sobre o amor.
Pode-se fazer amor sem amar.
Pode-se amar sem fazer amor.
Mas o amor salva tudo. Nem carece das palavras...

Quisera escrever para o mundo um poema de amor
se o mundo soubesse o seu real valor.
Mas, o mundo não sabe…
…O mundo não sabe!…

 ABANDONO

Despidas as árvores
arrefecem ainda mais
o inverno implacável.

 Tristes desprotegidas
sofrem assaltos mutiladores
e velam-se umas às outras
tentam segurar os membros ameaçados
gemem
no interior de seus velhos troncos.
Curiosas até às raízes suspiram:
Para onde fugiram as sombras?
Como se agasalham agora os pássaros?
Onde se esconderá o amor?

 FILOMENA FONSECA

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