quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

COMUNICAÇÕES II


MULHERES, FIGURAS DE NAÇÃO. ROSALÍA DE CASTRO E MATUA DA FONTE

JOSÉ VIRIATO CAPELA

Prof. Catedrático e Presidente da Casa Museu de Monção/Universidade do Minho

A ideia de Nação e Nacionalismo, como é sabido, é uma ideia “moderna”, do nosso século XIX, depois levada ao paroxismo com os Estados-Nação do século XX. Na base tem comumente o sentido de construção e reforço de identidade nacionalista e patriótica dos povos, com horizontes expansionistas assentes em múltiplos fatores, linguísticos, étnicos, geográficos, históricos, económicos, entre outros.

Na Península Ibérica eles também atuariam no sentido de reforço dos Estados e estão na origem da construção de Estados totalitários – Franquista e Salazarista – que se formaram em paralelo dos violentos Estados Fascistas italiano e nazi-alemão.

No que diz respeito a Portugal e Espanha, no seio da Península Ibérica, eles serviram para firmar as identidades e claras separações entre os dois Estados Peninsulares, isto sem embargo, algumas colaborações e aproximações entre ambos os regimes. A construção do Nacionalismo unitário franquista em Espanha teve, de algum modo, de se construir com e contra os nacionalismos e autonomias regionais; em Portugal o Nacionalismo português não se debateu com projetos de nacionalismos ou autonomias regionais. Reforçou a identidade nacional face a Espanha, de algum modo também o todo unitário de Estado colonial. E na Historiografia desenvolveu os estudos na perspetiva de valorizar dos fatores da identidade e singularidade da História portuguesa no conjunto peninsular.

A História Portuguesa, tem sido construída na base de uma Historiografia escrita por homens. Em particular, esta História dos Nacionalismos, que sendo um capítulo que envolve, de modo especial, domínios ligados a Ação política e militar, tem sido escrita sobretudo com base na História Política e militar e dos feitos heroicos dos portugueses.

As formas de nacionalismos, de base regional, que querem exprimir a força e identidade dos povos, numa perspetiva da sua afirmação particular em conjuntos mais vastos, que não passam necessariamente pela construção de grandes Estados, é uma realidade que não deve ser esquecida da História dos Povos, até porque eles põem em marcha outros agentes e referentes.

E relativamente a Espanha aí estão as múltiplas formas históricas de lutas, com base nas suas identidades «nacionais», pelos regionalismos, pelos estatutos autonómicos, pela própria independência nacional. Em Portugal, as manifestações desta índole nunca foram além de reivindicações regionalistas, sem horizontes políticos que não sejam o de defesa e promoção dos interesses regionais e num vago Provincianismo de base administrativa. A Língua Portuguesa – que é única e forte no todo nacional e nas terras da Expansão Portuguesa – e a precoce construção de um Estado centralizado nunca propiciaram desenvolvimento de entidades regionais. O que é facto é que estes Estados fortemente centralizados provocam os maiores desequilíbrios no desenvolvimento nacional, que tanto ou mais que outros sentimentos de secundarização política, social, ou cultural, provocaram os movimentos reivindicativos regionais.

São conhecidos em Espanha desde o século XIX as lutas de algumas regiões, designadamente na nossa vizinha Galiza que desembocaram nos Estatutos Autonómicos. São também conhecidos em Portugal as reivindicações regionalistas da mesma etapa, que acabam por definir prosaicamente e temporariamente a Província (1936) como entidade administrativa. A tradição municipalista entre nós, desembocou, no Poder Local. A História dos movimentos regionalistas e pela autonomia ou mais prosaicamente, pela defesa das tradições e «liberdades» dos povos – face às Culturas e Estados Nacionais – escreve-se na Galiza e em Portugal, também com o nome de duas mulheres, Rosalía de Castro e Maria da Fonte. Elas vão associadas a processos de defesa e construção de identidades nacionais no século XIX de base regional e deixam bases para o futuro. Nessa perspetiva se lhes aplicará também o epíteto de Figuras de Nação, porque vão associadas à construção das bases e ideias dos Nacionalismos para as suas terras e regiões (caso de Rosalía) ou de outro modo de conhecer (defender) a Nação tradicional Portuguesa face às mudanças do Liberalismo (Maria da Fonte).

Apesar destas circunstâncias, não parecerá a muitos admissível a aproximação destas duas figuras, que exprimem a sua intervenção de modo muito diferenciado. De facto, uma, Rosalía de Castro, figura histórica bem fixada, na sua terra natal, na sua biografia, na sua obra literária e cultural; outra, Maria da Fonte, de difícil se não impossível fixação pessoal – identitária, mais expressão de movimento coletivo de mulheres, do que ação individual, isto é, mais mito do que realidade.

Mas a razão desta aproximação decorre do papel que ambas as figuras tiveram no processo de defesa e construção de identidades locais e regionais, em tempo de ativa absorção estadual e cultural dos seus territórios, a Galiza no grande Estado e Nação de Espanha, o Minho, e por ele uma certa personalidade e identidade social e cultural, no Estado e Nação Portuguesa, no século XIX.

São ambas contemporâneas do processo de abolição do Antigo Regime e de construção do Liberalismo em Espanha e Portugal, de disputas entre liberais e absolutistas e dos seus diferentes projetos de Sociedade. Atentam ambas por meados do século XIX, num estádio já desenvolvido da implantação do novo Estado Liberal, mais centralista que o Estado Absolutista do passado. E vivem e refletem o quanto essa evolução política tem sido feita contra ou a desfavor dos Povos e das Culturas das suas regiões e províncias.

Rosalía fixará por então desde meados do século XIX em prosa e poesia a mais dolorida expressão a que está a ser votado o Povo Galego, pelo desprezo e desclassificação a que está a ser votada a Língua galega e sua Cultura no seio de outras Nações peninsulares, face a Castela, sobretudo. E também, às forças económicas e anímicas da Galiza, que se estão a exaurir sob o efeito da Emigração. Galiza que considera e elege como mais rica e úbere região de Espanha se a libertarem dos estrangulamentos a que vai submetida.

Maria da Fonte, de armas na mão, a partir da Póvoa de Lanhoso, também a meados do século, desde 1846, mobilizará o povo minhoto e nortenho contra as instituições do Liberalismo e do Cabralismo em defesa das «Santas Liberdades» que aqui são a uma expressão mobilizadora a defesa das velhas tradições contra um Estado e Governo Ditatorial.

Aproxima então Rosalía de Castro e a Maria da Fonte o mesmo sentido de defesa da autonomia das terras e das regiões e vontade da sua afirmação política e cultural, em tempos, em que regiões e províncias periféricas como a Galiza e o Minho estão a ser secundarizadas e diminuídas.

Estamos em face de movimentos de natureza diferente: um que pelas Letras e Cultura quer defender e promover o seu povo e lançar os fundamentos do resgate do Povo galego; outro que pelas Armas quer combater um Estado centralista e opressor que governa contra a Nação, isto é, contra os Povos.

São conhecidas as armas e as gestas militares da Revolução da Maria da Fonte que logo se estenderá a todo o Minho e que tomará a designação de Revolução do Minho.

Para Rosalía de Castro é a Cultura e a Língua que devem ser as Armas defesa do Povo Galego. Vale a pena fixar aqui a apresentação de Rosalía à sua mais notável obra que virará matriz do galeguismo, os «Cantares galegos» (1ª ed., 1863; 2ª ed., 1872)..

«E a nossa língua não é aquela que bastardeiam e champorrem torpemente nas mais ilustradíssimas províncias, com uma risa de mofa, que a dizer verdade (por mais que esta seja dura), demonstra a ignorância mais crassa e a mais imperdoável injustiça que pode fazer uma provincia à outra provincia irmã, por pobre que esta seja. Mais é aqui que o mais triste nesta questão é a falsidade com que fora daqui pintam, assim os filhos da Galiza como a Galiza mesma, a quem geralmente julgam o mais despreciado e feio de Espanha, quando acaso seja o mais fermoso e digna de alabança».

Qual o diferente legado das ações e obras destas duas figuras (movimentos)?

Em Rosalía de Castro o mais profundo sentido otimista do destino do Povo e Nação galega. E também do papel e lugar da sua Língua que com a sua obra será a verdadeira fundadora do Galego como Literatura Moderna. Na Maria da Fonte e Revolução do Minho, o sentido da luta contra os autoritarismo e despotismos e a defesa dos valores tradicionais dos povos e regiões.

A Maria da Fonte, como ação política teve efeito imediato no Levantamento Minhoto, Nortenho e Nacional contra o Governo de Costa Cabral e suas medidas, que levam à sua queda. A obra literária e poética de Rosalía de Castro só será o fundamento da luta pelo nacionalismo galego, mais tarde, porque a sua obra só será publicada lida e reconhecida, por finais do século XIX e no século XX em que perduraria pela «atração insuperada dos seus versos regionais».

De qualquer modo ambas tiveram um papel importante nos processos dos ressurgimentos nacionais e nacionalistas de finais do século XIX, que preparam os movimentos republicanos, em Espanha e Portugal, e que passam, em ambos os casos pela valorização, papel e lugar que devem ter os territórios, as províncias, as regiões no processo global dos Ressurgimentos Nacionais.

Rosalia de Castro virará a maior referência dos promotores do Nacionalismo Galego. Maria da Fonte, suporte de um vago Regionalismo e Provincianismo bandeira de forças liberais e conservadoras, na sempre expressão da capacidade das terras e regiões de afirmar a sua identidade e tradição.

No final de contas, também, dois modos diferentes de intervir, de base feminina: o literário, o cultural, da obra individual que mobilizará as vontades a mais largo prazo do povo que contra e a quem se dirige; o belicoso e guerrilheiro do movimento coletivo, de rutura e gestos violentos mas que sempre também se perpetuam e vem à memória.

 

ARTE NO FEMININO

Arcelina Santiago, comissária da exposição

Os meus cumprimentos a todos os  excelentíssimos membros da mesa e convidados e um agradecimento muito especial ao Sr Prof Dr. Viriato Capela e Dra Sandra por terem desde o começo abraçado esta iniciativa.

Fazendo a ligação entre os dois temas aqui abordados, diáspora e literatura, com a arte, tema que tratarei, embora não seja especialista de arte, mas sim apreciadora e considero-a mobilizadora de causas.   

Começarei  por mencionar Ana Harthely que reúne estas três dimensões, uma forma singela também, de prestar  homenagem  a uma mulher portuguesa da diáspora que ao deixar-nos, deixa o mundo cultural português mais pobre. Artista plástica , poeta, romancista, ensaísta, estudiosa da poesia barroca, "a pintora da palavra", como alguém a chamou, tem mais de 400 poemas publicados." Tisanas " livro de pequenos poemas foi o mais conhecido. Deixa-nos uma extensa obra , patente na fundação Calouste   Gulbenkian, no Museu de Arte contemporânea , Serralves , Museu do Chiado e muitos mais.

 

Abordarei, então , a perspectiva da arte, fazendo a ponte para  a exposição que também nos traz hoje aqui a está Casa Museu e que muito me apraz pois está casa  faz  parte da história da minha família. 

A arte é efetivamente  aglutinadora de culturas, de saberes e sentires e de reforço das relações humanas . Ela gera emprego, propicia a socialização, e promove mais valia quando se cruzam culturas, como tão bem referiu Isabel Ponce leão no Encontro Mundial da Diáspora, promovido pela Associação Mulher Migrante, em 2013  " A arte apresenta-se como um domínio propício a construções interculturais sendo, como é, expressão de criatividades idiossincráticas. É justamente neste encontro de diferenças que se gera a comunhão de saberes e de afetos e se demanda o cosmopolitismo de que o século XXI não abdica . A arte assume por si só , a superação de particularíssimos e difunde linguagens universais propiciadoras de um ecumenismo prático. Tendo como certo que as políticas públicas e os seus agentes podem e devem tornar-se mais amigos da criação artística de matriz intercultural. (...) Identidades e diferença são conceitos que apontam para um espaço continuo, sem fronteiras , onde o eu e o outro partilham crenças e estéticas fazendo desmoronar posições dominantes e subalternas...

Assim , sobre a riqueza que pode trazer esta multiculturalidade da arte no feminino, bem como a partilha de temas relacionado com as mulheres, lançamos um repto cultural aproveitando a presença dos excelentíssimos, representantes políticos e responsáveis do projeto  "Euro Cidade  Monção  /Salvatera do Mino, a saber:  partilha e intercâmbio  de âmbito galaico português  nestes moldes -  exposição e colóquio numa cimeira a ser realizada de dois em dois anos, com o tema "expressões de cidadania no feminino " . Temos muito a partilhar e a debater sobre a forma como aconteceu a diáspora nos dois países e a sua relação  com a arte,  uma tentativa de leitura do mundo contemporâneo com vista à estruturação de uma cidadania multicultural , igualitária e emancipatória , de formação humanística  cosmopolita.

Depois deste repto, lembro o passado e as mudanças que aconteceram, provavelmente muito à semelhança do que se passou com as mulheres do nosso país vizinho. 

Da memória do passado, conservamos a imagem da mulher doméstica com funções e divisão de papeis, marcada por uma construção meramente social. A afirmação das mulheres foi uma caminhada árdua e ainda não acabada, num mundo dominado pelo masculino. Ainda hoje, se há áreas em que a discriminação foi praticamente  ultrapassada, outras há  em que um longo caminho ainda vai ser necessário  percorrer. Hoje as mulheres estão presentes em todos os domínios: da investigação à economia, da tecnologia ao empreendedorismo, da literatura à arte, da ciência ao desporto, do ensino à administração, do direito  à política. No entanto, a sua presença é ainda escassa  em lugares de topo,  e os seus salários  são quase sempre mais baixos em relação aos homens , no desempenho de  iguais tarefas.  O sistema de cotas imposto em alguns domínios veio obrigar a  algum equilíbrio, forçado, é bem verdade,  mas as experiências de alguns países, mostram-nos que pode ser um meio de estímulo para as mulheres e uma alteração do status quo, construído em termos sociais com dominância no masculino.

Do passado lembramos também a quase inexistência da presença de mulheres em certas áreas e a sua  concentração em áreas sócias, dos serviços e  na educação. A nível de literatura por exemplo, aconteceu escreverem com pseudónimos masculinos, para obterem melhores críticas e melhor aceitação social. Maria Archer,  jornalista e escritora, mulher da diáspora,  já homenageada pela Associação Mulher Migrante, teve a ousadia de não o fazer e denunciou essa discriminação , que  lhe valeu o exílio. 

Felizmente que as conquistas de abril abriram portas  às mulheres na luta pelos seus direitos: liberdade, autonomia, independência... A Associação Mulher Migrante  com mais vinte anos de existência tem contribuído para esta luta pela igualdade e visibilidade das mulheres. Deu enfoque deste tema na sua última edição de 2014, com o título de " 40 anos de Migrações em Liberdade " e dedicou o tema " Expressões femininas da Cidadania" em 2013. Neste ano, no Encontro Mundial de Mulheres na Diáspora colocaram-se em debate estas duas questões que volto a trazê-las para este colóquio. 

. Será que as mulheres terão de percorrer um caminho mais árduo do que os homens para a sua afirmação no domínio artístico?

. Serão as artes um veículo com particular potencial para a afirmação da agenda da igualdade de género? 

Podemos constatar que, com a chegada de abril, também na arte aconteceram mudanças desejadas.  A liberdade de expressão e de exposição pública deu às  mulheres das artes possibilidade de darem o seu grito de explosão criativa.  A promoção da cultura e da divulgação da arte no feminino  tem sido um ponto forte de alguns municípios e associações, contribuindo com eventos diversificados. 

Os Estados vêm agora na cultura um grande potencial, um poderoso soft power utilizados nos seus esforços de diplomacia pública para afirmarem as suas identidades e potencialidades.

Quero salientar neste ponto, o contributo das mulheres intelectuais tão importante  na luta pela igualdade pois  transportaram para a ribalta trajetórias identitárias de mulheres que até agora estiveram nas margens, como tivemos a oportunidade de constatar pelo testemunho da professora Dra. Luísa Malato. 

No mundo das artes as mulheres têm sido lutadoras através do acto criativo, construindo imagens pictóricas e metafóricas que invadem o nosso imaginário e que nos fazem sonhar bem alto e que só a arte tem esse condão, como disse um dia o poeta Adolpho Rosse " depois escutai : não é a cotovia quem canta ... é o pássaro cor do infinito" . 

E se a pintura e a escultura é uma reorganização permanente de metáforas, então,  que elas inspirem os nossos sonhos! É esta a proposta destes criativos e criadores que temos presentes na exposição hoje aqui a ser inaugurada.

Sobre ela, acrescentarei que  é essencialmente  feminina, não por acharmos  que devemos discriminar os homens,  mas sim para se aproveitar a ocasião para chamar a atenção para a questão da igualdade de género tema que a edilidade monçanense também abraçou.

A introdução de um artista monçanense, Ricardo de Campos, foi simbólica. Por um lado, queremos homenagear esta terra minhota,  por outro, mostrar  que nesta luta, homens e mulheres terão de estar unidos  porque deles depende a conquista de uma sociedade mais justa e equilibrada e promissor, mais feliz.

Temos então propostas abertas a novas interpretações de  seis mulheres criadoras, no domínio da escultura e da pintura contemporânea, com diferentes formas de expressão, reflexo de vivências múltiplas, com algo em comum - o olhar feminino do mundo que as rodeia, a sua sensibilidade estética como expressão de cidadania. Assim, estas obras de arte afiguram-se como metáforas poéticas  onde se pode contemplar o pormenor e o geral, o concreto e o abstracto, o simbólico e o real, o particular e o  universal. Busca-se pelo traço, pelos efeitos cromáticos, pela luminosidade, pelos materiais e pelas texturas, a dimensão das pessoas, dos seus rostos, sulcados de histórias de vida;  as formas, os movimentos, a leveza da expressão, enquanto seres em mudança; procura-se na natureza e no enraizamento, necessário para nos tornarmos mais Pessoas, a busca do pormenor e do geral, patente em descrições de equilíbrio e serenidade que só as  árvores, enquanto símbolo anímico  da vida, nos sugerem. Abraçar o  abstracionismo  permite-nos mergulhar nos sonhos e nas utopias que alimentam a vida. A dimensão cósmica, permite-nos ter uma visão ainda mais abrangente, onde o homem, elemento do universo, na dialética constante vida-morte, espreita em várias telas . São apenas algumas propostas de leitura que deixo em aberto...Trata-se de pintura e escultura contemporânea, uma primeira mostra em Monção de uma manifestação artística que quer  promover o debate de ideias em torno da expressão de cidadania no feminino e que não se esgota na arte, mas que tem nela um ponto alto da sua expressão, daí a realização de um colóquio que antecede a exposição. 

É para mim uma honra ser comissária desta exposição. Vou apresentar-vos as artistas, dando alguns breves tópicos, e certamente que os detalhes ser-vos-ão transmitidos pelas próprias. 

 Luísa Prior, com a sua avassaladora perspetiva cósmica do universo ;  Filomena Fonseca, retratista exímia da expressão humana;  Maria André, aguarelista da luminosidade e da mestria do pormenor;  Teresa Heitor, com o destaque para uma intensa  força anímica da natureza -  as árvores;  Lena Álvares, com a exuberância da arte em vidro aliado ao poder e simplicidade dos troncos;  Filomena Bilber com as suas bailarinas cheias de graciosidade e muita alma; Ricardo de Campos com a sua arte irreverente, de impacto, onde  mulheres surgem despojadas de preconceitos .

  São as artistas desta coletiva, curiosamente, todas elas representadas na Bienal de Gaia, evento de grande referência cultural, a nível nacional e internacional. O mesmo acontece com Ricardo de Campos presente nessa  mesma  bienal e também na Bienal de Cerveira. São membros da Associação Mulher Migrante,   mulheres criadoras que, com a sua arte expressam a sua cidadania  ativa, defensora de causas.

 Termino, voltando a repetir o repto  inicial: a proposta da cimeira entre dois países vizinhos que têm certamente tanto para partilhar sobre as dimensões das mulheres aqui focadas, mas muitas outras existem. 

 Para dar corpo a esta iniciativa futura,  porque não começar com uma itinerância de arte e debate de ideias , no modelo aqui apresentado, ainda tímido, mas com uma força de querer avançar com outra dimensão?

 

EXPRESSÕES DE CIDADANIA NO FEMININO

Nassalete Miranda

Agradecer e felicitar, dois verbos que se impõem para falar da excelente e oportuna iniciativa cultural e cívica que foi a que teve como título: “Expressões de Cidadania no Feminino” e que aconteceu em Monção em 5 de Setembro do ano da Luz 2015.

Agradecer ao Município de Monção, à Reitoria da Universidade do Minh e à Casa Museu de Monção todo o apoio dado, e desde o primeiro momento, à ideia de levar a terras de Deu-la-Deu, um debate e uma exposição de pintura e de escultura, em acto de efectiva descentralização da Associação de Estudo, Cooperação e Solidariedade Mulher Migrante. Associação a que é devida uma palavra de felicitações, nas pessoas das Dras. Manuela Aguiar, Rita Gomes e Arcelina Santiago – obreiras incansáveis que teimam em não cruzar braços no que respeita ao apoio da integração da mulher portuguesa emigrada mundo fora, através precisamente da Cultura, no sentido mais abrangente e global da palavra e da solidariedade.

Coube-me a honra de moderar um debate rico pela qualidade dos intervenientes e que teve sobre si o olhar sorridente da  figura emblemática e mítica de Deu-la-Deu Martins -  que muitos ainda pensam que foi homem…mas não – foi mulher e resolveu, pela astúcia e com pão, o cerco a Monção durante as guerras fernandinas, no séc. XIV.

Falou-se do futuro, nessa tarde que reuniu mulheres e homens não só de Monção, mas idos de várias partes do País e que na secular Casa Museu partilharam saberes, experiências e sobretudo, projectos, na certeza que o passado interessa estar presente na justa medida em que impulsiona para a concretização dos objectivos futuros.

A Reitoria da Universidade do Minho fez-se representar através do Prof. José Viriato Capela, director da Casa Museu de Monção, o Município de  Monção na pessoa do seu vice-presidente, a Associação de Estudo, Cooperação e Solidariedade Mulher Migrante, através das presenças das Dras. Manuela Aguiar, Rita Gomes e Arcelina Santiago e a Universidade do Porto na pessoa da professora Maria Luísa Malato.

Um agradecimento particular dirigido ao senhor Alcaide de Salvaterra do Minho, que se fez representar pelo Dr. E que com o seu apoio titulou como internacional e transfronteiriça a referida sessão que contou com o apoio da Quinta de Santiago e do jornal As Artes entre Letras. 

Há que felicitar também todos os que se envolveram directa ou indirectamente para dar luz ao evento, destacando e  agradecendo a presença dos artistas que integraram a exposição colectiva de pintura e de escultura, comissariada pela Drª Arcelina Santiago,  a abelha mestra e mediadora daquela inesquecível tarde.

Todas as intervenções foram dominadas pela preocupação com a igualdade de género, através da Cultura e da Educação

sendo de salientar o trabalho pedagógico e contínuo do município de Monção no combate à violência doméstica, já com resultados positivos. O Dr Paulo ESteves, um estudioso da matéria, mostrou a firme vontade de continuar este trabalho na certeza de que o ser humano afirma-se pelo que decide e que qualquer fatalismo é sempre contraditório à humanidade

Neste sentido e sob o lema “Nenhuma pessoa é estrangeira numa sociedade que vive os direitos humanos”, nasceu a Associação de Estudo, Cooperação e Solidariedade Mulher Migrante que já conta com mais der duas décadas a desempenhar papel importante e transversal entre a Cultura e a Cidadania, ajudando a manter vivas as tradições e língua lusa com um trabalho exaustivo junto das comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo, dando destaque e revalorizando o desempenho da mulher nesse sentido.

“Expressões de Cidadania no Feminino” foi o tema do colóquio que apenas figura no passado do calendário, porque há um movimento para que este tema mantenha vivo o interesse de outros debates também no mundo de todas as expressões no masculino.

A Profª Maria Luísa Malato, da Faculdade de Letras da UPorto levou a debate a figura de  Catarina de Lencastre, 1ª Viscondessa de Balsemão, mulher que marcou literariamente o século XVIII e XIX e que foi alvo da sua tese de doutoramento. Apesar de estar esquecida no tempo, ou até talvez por isso mesmo… continua a levantar a questão, entre outras,  da existência de uma escrita no feminino.

Numa época em que só existe o que é visível, levar àquela sessão o nome de Catarina de Lencastre foi um enorme desafio a algumas modas intelectuais que teimam em manter fechadas as páginas da História escritas e protagonizadas por mulheres. É que os tempos vão mudando mas há vontades que permanecem!

A Dra. Maria Manuela Aguiar, sabemos, os que temos o privilégio da sua atenção, é uma das nossas guerreiras.

Deveria entender-se bem com a Deu-la-Deu…

A intervenção da Dra. Maria Manuela Aguiar foi viva e recheada de episódios de vivências nos cinco continentes onde mulheres portuguesas se encontrar emigradas. Presidente da Assembleia Geral da Associação "Mulher Migrante" da qual foi uma das fundadoras, a Dra. Maria Manuela Aguiar possui um curriculum vasto e rico, sendo o denominador comum da sua viva a defesa dos direitos no que respeita a igualdade de género.

Se eu tivesse que escolher uma ”dama de ferro” portuguesa, nesta nossa contemporaneidade, seria sem dúvida a Dra. Manuela Aguiar que se assume feminista sem ocultar o feminino e que se entrega à Diáspora em trabalho missionário!

Professora Arcelina Santiago, Mestre em Ciências Sociais Políticas e Jurídicas pela Universidade de Aveiro, está ligada a Monção por laços familiares e a um projecto de vinho Alvarinho e a sua intervenção foi dominada presença literária e histórica de Ana Harthely que fez da sua viva um cruzamento entre história, diáspora, arte e literatura.

Detentora de palavra viva aproveitou a ocasião para lançar o desafio da criação do projecto cultural Monção/Salvaterra do Minho - Euro Cidade.

Pois que é preciso que este projecto saia do papel…

O Prof. José Viriato Capela foi o último palestrante. A presidir desde 2002 à Casa Museu de Monção  -  que é um braço cultural da Universidade do Minho, integra o corpo docente daquela Universidade bem como o Centro de Investigação transdisciplinar Cultura, Espaço e Memória, desta Instituição de Ensino Superior. Foi o nosso anfitrião numa Casa que é o exemplo vivo de como uma Universidade pode e deve estar ligada ao meio.

Intervenção que recolocou no debate a importância da descentralização deste tipo de iniciativas, pontuada pelo relato de factos históricos que catalogam Monção como uma terra de História, de vinho, de tradição e quer também afirmar-se pela Cultura num esforço conjunto entre a Academia, o Município e o desafio transfronteiriço.

 Seguiu-se a inauguração da exposição A Arte no Feminino integrada por  6 mulheres: Luísa Prior,  as Filomenas Fonseca e Bilber, Maria André, Teresa Heitor, Lena Álvares, e um homem o artista monçanense Ricardo de Campos – não, este artista não foi a cereja no topo do bolo – foi o homem/pintor convidado porque o feminino também se cumpre no masculino!

Passado que está este tempo sobre essa tarde de fim de verão em Monção, na Casa Museu, mantenho vivas as cores das telas, as formas das esculturas, as palavras dos intervenientes, a frescura e o gosto do Alvarinho da Quinta de Santiago e sobretudo o sorriso de todos e aquela sensação indescritível de que durante umas horas o mundo avançou e com ele o nosso País e a nossa Gente!

Havemos de voltar ao lugar onde fomos felizes!

 

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