quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Á CONVERSA COM O DR. JOSÉ CESÁRIO Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas do XX Governo Constitucional Nos últimos dias do XX Governo Constitucional, Miguel Leite e eu pedimos ao Dr José Cesário uma entrevista, destinada à publicação da Associação Mulher Migrante do ano de 2015. A conversa fluiu, ao longo de quase duas horas, que passaram muito depressa. Aqui fica o registo desse diálogo a três vozes. ML – No âmbito do exercício das suas funções, e em jeito de balanço final de mandato, quais os aspectos que o Sr. Secretário de Estado gostaria de destacar, concretamente focando as acções que mais lhe pareceram bem-sucedidas e, naturalmente, referenciando também aqueles aspectos que eventualmente tenha considerado menos bem conseguidos… JC – Há aspectos em que considero que tivemos sucesso. Em outros admito que não tenhamos atingido a totalidade dos objectivos. Conseguimos dar um passo que considero muito importante na credibilização da rede de ensino espalhada por esse mundo fora. Em 2011, tínhamos umas centenas de professores que o Estado pagava, mas não sabíamos exactamente quantos alunos é que frequentavam os cursos, não avaliávamos as suas aprendizagens, nem sequer tínhamos programas... E havia uma desigualdade total entre o que se passava fora da Europa e na Europa! ML – Se me permite a interrupção, podemos admitir que havia um plano pouco organizado, ou semi-organizado, no qual os senhores pegaram e reorganizaram com objectivos definidos… JC – A questão é esta: Não havia sequer um plano! Bastava-lhes dizer que tinham não sei quantos professores colocados em determinados países. Independentemente dos resultados. ML – Independentemente de se aferirem resultados… JC – Ora bem: O que nós fizemos – e é uma das coisas de que eu mais me orgulho - apesar das grandes dificuldades económicas, que nos obrigaram realmente, em determinados momentos, a reduzir o número de professores - foi credibilizar o ensino que ministrávamos às crianças. E como? 1º - Passou a haver Programas; 2º - Organizámos o registo dos alunos que frequentam os cursos; 3º - Passámos a avaliar as aprendizagens e a certificá-las… Hoje os alunos que frequentam esses cursos têm um certificado das aprendizagens. Os últimos certificados à escala central tinham sido passados há, pelo menos, uns vinte anos atrás! Esta é uma questão fundamental. MA – Era um sector que dependia do Ministério da Educação... JC – Era. Também me orgulho muito de termos lançado um Plano de Incentivo à Leitura, que implicou a aquisição de milhares e milhares de livros de autores portugueses (livros infantis e juvenis), num total de cerca de 700 mini-bibliotecas que foram distribuídas por escolas, bibliotecas escolares e associações com actividade cultural, com um objectivo preciso: tentar que as Comunidades Portuguesas leiam, começando pelas crianças e pelos jovens… Ninguém em Portugal adquiriu tantos livros a autores portugueses como nós, nestes quatro anos! MA – E isso pode dizer-se tanto dentro como fora da Europa? JC – Globalmente. Aliás, há aí um progresso a salientar, que é o de termos voltado a distribuir Manuais Escolares fora da Europa, para além das mini-bibliotecas. Criámos Coordenações de Ensino, onde não existiam, por exemplo, na Austrália, na Venezuela. Outro aspecto significativo - que teve um grande impacto sobretudo nas comunidades mais periféricas - foi o Programa das Permanências Consulares. Desde 2013, o Serviço Consular Itinerante chegou a cidades onde nunca tinha havido a prestação de serviços consulares, com equipamentos novos de tecnologia portuguesa, que permitem hoje aos postos consulares tratar dos documentos administrativos essenciais para os portugueses. Vamos junto das pessoas. ML – Portanto, mesmo em terras onde não há Consulados… JC – Em mais 150 Cidades onde não há Consulados. ML – Aumentaram muito a rede de serviços… JC – Sim. Eu dou-vos exemplos concretos: Cambridge, Edmonton, Manaus, São Luís do Maranhão, S. Diego, Turlock, Tulare, Sault Ste. Marie, Winnipeg, Kitimat… Por exemplo: Winnipeg tem Consulado Honorário, mas não podia fazer Cartões de Cidadão. E com este equipamento passou a poder fazer. MA – Winnipeg tinha um homem competentíssimo à frente do Consulado. JC – É, tem. É muito competente. Portanto, isto em mais de 150 cidades e a correr bem! MA – Também na Europa e fora da Europa? JC – Em todo o lado. Foi um trabalho global. Mas mesmo na Europa há problemas gravíssimos a esse nível. Deixem-me dar-vos um exemplo curioso- o Luxemburgo, onde o ponto mais distante em relação ao consulado está a 40 quilómetros… Ora, fizemos aí mais de 70 permanências consulares por ano. Prova de que era necessário! Há um fenómeno europeu, que tem a ver com a proximidade em relação a Portugal (também acontece fora da Europa, mas menos), que é as pessoas tratarem dos documentos de identificação, quando vêm a Portugal de férias. Porquê? Porque a acessibilidade aos consulados é difícil. Implica sempre a perda de pelo menos meio-dia de trabalho. Isto correu bem! Outra coisa de que se pode dizer o mesmo é termos conseguido, nestes anos, através de múltiplas acções de formação, encontros, etc. despertar umas dezenas de dirigentes associativos, mais ou menos jovens, que estão hoje a trabalhar em muitas associações em que não trabalhavam… MA – E mulheres? JC – Muitíssimas mulheres! Desses dirigentes associativos novos eu diria que, seguramente, metade são mulheres. Posso até referenciar alguns casos: Ana Miranda em Nova Iorque, Jennifer e Raquel Rosa na área de Nova Jersey… Gente nova… Em breve vou para o Encontro do Cone Sul, onde há um Grupo de Mulheres, quer em Buenos Aires (jovens, algumas à frente de associações), quer em Ijuí, quer em Porto Alegre… Em Montevideu já há três ou quatro mulheres jovens que me parecem capazes de pegarem, futuramente, na Casa de Portugal... MA – Acontece em alguns países - o rejuvenescimento da liderança traz a igualdade de género. JC – Há casos em que isso é muito evidente. São talvez fifty/fifty, (homens e mulheres)... Isto correu bem! Coisas que não correram tão bem: por exemplo, as campanhas de mobilização para a participação política! Embora num país ou noutro se tenha dado já um salto, estamos muito aquém daquilo que é minimamente desejável, quer na vida política portuguesa, quer na vida política local. ML – Deveria haver muito mais participação política… MA – Quanto a participação política, seria interessante comparar o caso galego com o nosso. Eles participam, têm muito mais inscritos no recenseamento e votam muito mais… JC – Votam muito mais. MA - Estão mais concentrados em certos países… JC – É. MA - Não seria interessante organizar uma espécie de Cimeira Luso-Galaica? JC – Acho que nós começamos por ter um problema mais grave do que qualquer outro povo no Mundo: a falta de cultura política!... MA – Em relação, por exemplo, aos Galegos? JC – E não são só os Galegos. Há outras comunidades em Espanha, a Comunidade Valenciana, a Comunidade Basca… Todas aquelas realidades regionais espanholas têm uma expressão nas respectivas comunidades, uma participação, que nós não temos. MA – Nós também temos uma expressão regional muito forte na Madeira e nos Açores, embora não em termos de participação política... JC – Porquê? Porque não há cultura política. MA – Não tenho dados sobre os outros casos da Espanha - só sobre a Galiza… JC – A Galiza é dos mais participativos. MA – Quando há campanhas eleitorais os principais candidatos ao governo autonómico, vão aos países de grande comunidade, à Argentina, à Venezuela… Têm um peso enorme! Cerca de meio milhão de eleitores, que votam mesmo… JC – Eles têm eleitos directamente nos Parlamentos Autonómicos… MA – Estou a comparar a Galiza com Portugal inteiro - só a Galiza tem muito mais votantes, não é? JC – Provavelmente uma coisa que poderá vir a ser discutida outra vez é a presença directa nos Parlamentos Regionais… MA – Sou absolutamente a favor! E a Constituição não é impeditiva... JC – Acontece isso em Espanha. Eles têm! Na Galiza têm! Tal como, por exemplo, em Itália… Em Itália, têm uma série de Senadores. MA – Se houvesse representação nas Assembleias Legislativas Regionais, talvez a mobilização fosse muito maior… Os Governos Regionais têm uma ligação mais próxima com as suas comunidades do que qualquer outra região de Portugal… JC – Talvez fosse… Mas não vale a pena iludirmo-nos, o problema da falta de cultura política é sério. O Português é mais acomodado. Veja-se o que se passa com o Conselho das Comunidades: os níveis de participação são absolutamente miseráveis! E estamos a falar de eleitos muito próximos das pessoas. MA – Talvez porque não saibam o que é o Conselho... JC – Não sabem. Mas a verdade é que cada candidato, à partida, é um líder (teoricamente). e lidera 30, 40, 100 pessoas… Tirando o caso de Macau, em que há especificidades… MA – No que respeita ao Conselho das Comunidades, e no que respeita à questão de género, os números não são muito animadores… JC – Não. MA – E há países que não têm representação feminina, o que é verdadeiramente estranho: Por exemplo, a América do Norte, apesar da presença de jovens, concretamente em Nova Iorque. JC – É um dos locais onde têm aparecido mais jovens! MA – Mas, curiosamente, não se interessam pelo Conselho. E não há uma única mulher representante nos Estados Unidos ou no Canadá, onde a Maria Alice Ribeiro e a Manuela Chaplin foram pioneiras… JC – A Raquel Rosa esteve para fazer lista, mas depois acabou por desistir da ideia… MA – O contrário aconteceu na Argentina e na Venezuela, onde as nossas associadas foram cabeças de listas e ganharam as eleições!Foi importante a "Mulher Migrante" ter centrado o associativismo feminino também no campo da participação cívica e política, e não só no setor social, como era a regra. Ou ainda é... JC – Sim. É, em regra é. MA – Sinal dos tempos, este movimento cívico feminino na emigração... JC – Pois. É verdade. Não tenham dúvidas… Estão a aparecer muitas, mesmo muitas! MA– O Conselho tem apenas 12, não é? JC– Sim… Há 12 em 63! MA– A Lei da Paridade só obriga a que o terceiro elemento de cada lista seja uma mulher… Ora muitas listas só elegem um ou dois elementos, homens… Deve ter sido o que se passou no Canadá e nos Estados Unidos. JC– No Canadá é pior do que isso… Porque no Canadá, em Toronto, não houve candidaturas… Em Vancouver também não houve… MA– Mas Toronto era o epicentro do Conselho das Comunidades do Canadá… JC– Houve lá uma rapariga nova, muito activa, que está a trabalhar no Consulado, é a responsável social, a Paula Medeiros. Quis fazer uma lista, mas não podia por ser funcionária consular… Essa teria conseguido, é dos elementos novos que ali está com muita garra. Toronto é dos casos que, claramente, correram pior. MA– O Ensino fora da Europa ainda está fundamentalmente nas Associações, ou não? JC– A maior parte dos alunos que temos fora da Europa estão em Cursos Integrados. Por exemplo, no Canadá, a maior parte dos alunos estão nos Cursos do Distrito Escolar Católico de Toronto e nas Escola Públicas. Não é o caso de Montreal, em que estão na Escola de Santa Cruz. MA– Uma Escola fantástica, com centenas de alunos! JC– Claramente. E, nos Estados Unidos, a maior parte dos alunos estão no Ensino Integrado de Massachusetts, que, aliás, recruta professores portugueses, cá. MA– As Paróquias também tinham escolas muito importantes… JC– Têm. Temos uma rede de escolas associativa… Só em Massachusetts, há pelo menos uns 7 mil alunos… ML– Nas Paróquias, se calhar são muitas, mas sem esse número tão significativo de alunos… JC– Hoje já não estão tanto nas Paróquias, mas nas Associações… Nas Associações devemos ter para aí uns mil e tal ou dois mil alunos. Na Venezuela, a nossa coordenação dá apoio. A maior parte dos alunos estarão nas Escolas Privadas e até nalgumas Públicas. Na Austrália é tudo associativo. Na Argentina temos uma experiência com uma Associação (na Gonzalez Catan) que, aliás, é presidida por uma mulher. Na África do Sul estão quase todos em Escolas Oficiais, não há associativas… MA– Na África do Sul foi um rude golpe para as associações o facto de o Ensino ter passado para o sector público… Isso aconteceu há já muito tempo… JC– As associações na África do Sul estão a atravessar uma fase muito difícil. É dos países em que estão pior… MA– O Ensino Associativo era muito importante para a a frequência e animação das Associações… JC– Nós temos lá, ainda, vinte e tal professores daqui. MA– E o ensino dado na perspectiva da Lusofonia? Havia cursos, apoiados pela Secretaria de Estado da Cooperação, na Namíbia, na África do Sul… JC– Na Namíbia está com uma expressão enorme! E já temos no Zimbabwe, na Suazilândia. Estamos agora a fazer lá a formação de professores. Começámos há três anos. Na África do Sul estamos na Wits e na Universidade de Pretória. Tudo isto com o Instituto Camões, na vertente de Ensino de Português no estrangeiro. Temos lá um Leitor de Português só para formar professores nessa área. Em Harare também já temos um professor. MA– No Centro Diogo Cão, na Namíbia, havia muitos alunos, os números eram superiores aos da África do Sul. JC– Sim, na Namíbia, os últimos números referiam dois mil e tal ou três mil alunos! A questão é que só em Windhoek há 100 mil falantes de português, angolanos… MA– Há uma população angolana muito grande, e esse ensino era muito dirigido também aos angolanos. Recordo-me que, em 2003, quando estive na RAS com uma delegação parlamentar, Portugal foi muito elogiado pelo Ministro da Cultura do Gauteng precisamente por ser o único país europeu que organizava cursos da sua língua para as populações africanas… ML– Estávamos então a focar-nos na Cultura. Cultura e Educação são, quanto a mim, conceitos complementares de certo modo mas, também, diferenciados… Sabemos, até directamente, que no exercício das suas funções teve também uma acção nesse aspecto… não descurou, digamos, esse lado da sua função. Portanto, gostava que nos falasse não só a título executivo ou governamental e geral de mandato, mas também que nos pudesse dar o seu testemunho pessoal… JC– Quando há pouco eu referi que houve um conjunto de dirigentes associativos novos que despertaram para a vida pública comunitária nestes últimos anos, estava a lembrar-me de que a maior parte das actividades que estes dirigentes desenvolveram foram precisamente de âmbito cultural. Por exemplo, voltando aos tais exemplos dos Estados Unidos, do Canadá, da Argentina, etc. Cada vez que eles vinham a Portugal, nós fazíamos acções de formação com eles e procurávamos que eles construíssem projectos culturais, culturais ou sociais… ML– Esse aspecto de lá para cá também é muito interessante… JC- Projectos culturais e sociais a contarem com os meios que existem lá e com os que existem em Portugal, conjugando tudo e até procurando que trabalhassem em rede. E, de facto, houve vários projectos… ações do género das que a Associação Mulher Migrante levou a cabo, nomeadamente connosco...Houve várias instituições locais a promoverem coisas idênticas, deslocando artistas lá, de várias artes… O Trio “Rumos Ensemble”, por exemplo, foi integrado em algumas dessas iniciativas. Houve imensos escritores que realizaram acções muito diversas… Conferências, Encontros com grupos, quer de alunos, quer de membros da comunidade… ML– Das Artes Plásticas e Visuais, também? JC– Menos, menos… MA– Um dos aspectos mais interessante destas Conferências/Concerto "Portugalidade", que levámos a cabo com a SECP, foi o não serem apenas concertos, mas lições... JC– Aquilo que vocês conseguiram fazer foi debate sobre questões culturais. Isso talvez tenha faltado noutras iniciativas… Acho que valeria a pena explorar mais esse aspecto futuramente. Agora, é muito importante que cada associação, que está seja onde for, em França ou na África do Sul, diga aquilo que pretende… O Rumos Ensemble foi à África do Sul e à Namíbia. E, pelo que sei, gostaram. Pode ser que tenham criado, ali, um “bichinho” qualquer… ML– Mas isso já foi, como diz, um conjunto de acções que nasceu em colaboração com associações locais… Porque a SECP também tinha meios exíguos ou limitados, parece-me… JC– Sim, tínhamos… É verdade. Mas, reparem: em boa verdade, com meios limitados bem administrados consegue-se fazer muita coisa… Por exemplo: quanto custa a deslocação de um escritor? A Luísa Fortes da Cunha (por exemplo), que escreve e edita muitos livros, e é muito activa. É uma mulher de 40 anos, relativamente jovem… Quanto custa levá-la à Austrália, à África do Sul? É apenas um bilhete em Classe Económica. Depois, está lá durante um período de tempo, pode vender livros, angariar leitores… Não é uma coisa cara! Faz-se uma acção com uma utilidade enorme, gastando apenas três ou quatro mil euros. MA– E também enriquece a programação cultural das próprias associações, atraindo novos públicos… JC– Claro que sim! E obriga os responsáveis consulares e das embaixadas a terem de estar a trabalhar conjuntamente com as pessoas dessas associações. Como sabem, a maior parte da actividade cultural das nossas embaixadas é muito para consumo do Corpo Diplomático… O Instituto Camões gasta muito mais dinheiro do que o departamento das Comunidades. Não há comparação possível! MA– O ideal era tentar fazer um articulação das ações… JC– E a orientação foi sempre essa! Só que a verdade dos factos, a prática, a contraria… MA– Depende muito das pessoas… Lembro uma acção da Associação Mulher Migrante em parceria com a SECP, que foi excelentemente apoiada pelo Instituto Camões em Bruxelas! JC– Mas Bruxelas tem uma particularidade… Quem estava à frente da Embaixada, interinamente, era o Conselheiro João Terenas,que tem vocação para isso e, apesar de ter poucos recursos, como estava sozinho, entregou a programação cultural à coordenadora de ensino… uma jovem, que trabalha muito com as comunidades! Isso são casos, não é? MA– Sim, e esses casos deviam servir de exemplo.... JC– De acordo. Só que a maior parte dos nossos embaixadores promove a cultura muito virada para estratos que não são propriamente os das nossas comunidades… MA– Julgando que as nossas comunidades não apreciam… JC– Certo. Eu queria aqui voltar atrás e dizer que a SECP procurou também desenvolver acções dirigidas à mulher, mas tudo isto integrado numa lógica global de reforço da participação, consciente de um facto: para as nossas associações se renovarem e terem uma actividade regular é fundamental a participação de três estratos: as mulheres, os jovens e o sector empresarial. Porque, hoje, os empresários começam a organizar-se nas comunidades, e a verdade é que, atrás da actividade económica, vem a cultural… Em França, se não fosse a Câmara de Comércio Franco-Portuguesa não havia nenhum jornal português! MA– No Conselho dos Franceses do Estrangeiro, desde o início, tinham representação as Câmaras de Comércio e os professores de Francês. Em Portugal nunca se foi muito por aí… Seria importante ter um Conselho representativo dos emigrantes, das comunidades mais recentes, mas também um verdadeiro Conselho da Diáspora? JC– Temos, à escala local, os Conselhos Consultivos que funcionam nessa lógica. Está lá tudo… Nos Conselhos Consultivos estão os professores, os dirigentes associativos (não todos, mas estão) … MA– E articula com o Conselho das Comunidades a nível local? JC– Tem de ser o Cônsul a fazer essa articulação. MA– Isso não significa pôr um capacete estatal numa coisa que deve ser mais da sociedade? JC– É uma coisa que irá acontecer, segundo a lei. Passarão a participar também nesses Conselhos Consultivos, elimina-se esse afastamento, à escala local. Outra coisa é aqui! Aqui é outra história… MA– Mas, à escala local, no fundo, o associativismo foi feito sem os Cônsules, não é? JC– Isto não é por causa do associativismo. É por causa da comunidade no seu todo! A ideia é termos ali um órgão em que estejam representados os sectores mais significativos de cada comunidade. E aí entram os empresários… A França, neste momento é o maior exemplo, mas no Brasil também se começa a notar isso. A instituição mais activa de S. Paulo é a Câmara do Comércio. E, em França, (não é em Paris, é em França), a mais ativa é a Câmara Franco-Portuguesa, que é, nomeadamente, proprietária do Luso Jornal… MA– Eu estava a pensar na ideia do Prof Adriano Moreira de coexistência de dois Conselhos, um para aos problemas sociais da emigração, outro para o universo maior da Lusofonia, com a sua dilatada fronteira cultural - e mais distante da partidarização... JC– Isso é diferente. Não. Isso não temos. MA– O que se designa como Conselho da Diáspora , sob a égide do Presidente da República, não é nada disto! Não têm um projecto, uma ideia.. JC– Deveria ter uma estrutura diferente. Reduz-se um encontro anual de um conjunto de pessoas… ML– Sem grande utilidade… JC– No fundo, eles vêem-se mostrar ao Presidente da República… E depois regressam às Comunidades e dizem: Eu estive com o Presidente da República! MA– Agora, além da comunidade dos empresários, irá crescer também muito a comunidade académica, com base neste surto da nova emigração? JC– Não sei se crescera. Primeiro: A nova emigração não se mistura com a emigração tradicional… MA– Essa era outra questão que eu lhe queria colocar: nova emigração e o velho associativismo… Como é que isso se conjuga? JC– É muito raro haver essa integração. Admito que isso venha a evoluir, ao fim de dois ou três anos… são mais individualistsa (isso é muito claro) . A questão é: O que é que eles querem fazer? É muito complicado… Há países em que é mais fácil… Dou um exemplo, S Paulo: Eles vão à Câmara de Comércio de S. Paulo, mas não vão à Casa de Portugal… Sei que há movimentações para tentar levá-los à Casa de Portugal… E estamos a falar de empresários… MA– Empresários de lá e investimento português lá... JC– Mas muitos deles são até empresas privadas de cá, que foram para lá, e que têm lá quadros… Uns são proprietários e outros não… Que dificuldade é que têm em ir à Casa de Portugal ou ao Clube Português? Nenhuma! Mesmo esses não vão… Então os outros nem se fala! O português que vai trabalhar para Zurique ou para Basileia ou para Genebra… Esses não vão, de todo. MA– Manuela Bairos, quando foi Consul em Boston criou o Boston Festival, que reunia todos, incluia tudo o que de bom se fazia na comunidade... JC– Mas o essencial do Boston Festival eram as comunidades que já estavam lá implantadas! MA– Eram. Mas o Festival trouxe a comunidade académica para junto da tradicional. Com o Prof. Mariano Gago (eu continuo a achar que Mariano Gago era um génio!), conseguiu todos aqueles acordos e trouxe a comunidade do MIT , de Harvard... JC– Sim, mas a participação deles era feita apenas num evento… MA– Para criar uma imagem, uma marca de Portugal, envolvendo toda a comunidade… JC– O problema é que a participação deles era feita apenas num evento, depois, não vão participar nas Associações… MA– Não. Não vão. Mas o Festival é uma fórmula em que estão todos… JC– O Boston Festival continua a existir, mas no dia em que o Consulado teoricamente fechasse o Boston festival, ele acabava! O problema maior é fazer com que as acções criem uma estrutura que caminhe por si. A ideia do Boston Festival é magnífica! Só que tinha de ter ganho autonomia e não ganhou. São os cônsules a puxar por aquilo. O contrário se passava, por exemplo - justiça lhe seja feita! - com o Bernardino Coutinho, que manteve a parada do Dia de Portugal, durante vinte anos! MA– Era o maior 10 de Junho do Mundo! JC– Era... Mas o maior ainda acho que foi sempre o de Toronto! E não tem nada a ver com o Consulado… É a Aliança dos Clubes e Associações Portuguesas. Voluntários… Agora, o Boston festival nasce, e bem, da seguinte maneira: a Manuela Bairos começa a bater á porta de um conjunto de empresas e entidades, arranja um pacote de dinheiro, chama as associações, constitui uma comissão entre elas… E continua a ser assim. O actual Cônsul faz a mesma coisa, o anterior também fez... A Aliança faz as coisas de outra maneira… Para o 10 de Junho, arranja meio milhão de dólares (que é o orçamento total), em que o Estado português não gasta um cêntimo - nem pode, porque aquilo dá lucro. MA– O 10 de Junho é uma das pontes de congregação… JC– Vocês conhecem as grandes Festas do Espírito Santo da Nova Inglaterra, de Fall River… Ali não há Consulado. São eles! (Neste caso são açorianos) … Na Califórnia, também há realizações e estruturas que caminham por si. MA– Considera que o grande paradigma de congregação associativa é a comemoração de uma data especial, religiosa ou civil, o 10 de junho, o 25 de abril? JC– O 25 de Abril ainda não consegue ser, mas o 10 de Junho já é! O TEMPO PASSARA MUITO DEPRESSA... ERA TARDE... TERMINÁMOS A CORDIAL E LONGA CONVERSA COM O DR JOSÉ CESÁRIO, ABORDANDO O TEMA DAS VÁRIAS FÓRMULAS DE UNIFICAÇÃO DAS NOSSAS COMUNIDADES, HOJE - COMUNIDADES PLURAIS, DIVERSAS, QUE TÊM DE ENCONTRAR O SEU MODO PRÓPRIO DE CONVIVER E DE COOPERAR ENTRE SI E COM PORTUGAL, COM A SECP, COM OS CONSULADOS... CONTUDO, NÃO LHE DISSEMOS DURANTE A ENTREVISTA, E QUEREMOS FAZÊ-LO AGORA, NO TERMO DO SEU MANDATO COMO SECRETÁRIO DE ESTADO, EM NOME DA AEMM, O QUANTO APRECIÁMOS E AGRADECEMOS TODO O SEU APOIO, O CONVITE PARA INICIATIVAS CONJUNTAS, OS CONSTANTES INCENTIVOS Á NOSSA AÇÃO JUNTO DAS MULHERES DA DIÁSPORA, A SUA SENSIBILIDADE PARA AS QUESTÕES DA IGUALDADE E DA CIDADANIA E, POR FIM, AGRADECEMOS MAIS ESTE GESTO DE SIMPATIA, NUM DIÁLOGO TÃO ABERTO E INFORMAL

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