terça-feira, 5 de junho de 2018

ENCONTRO DE PORTUGUESES NAS MARGENS DO RIO PRATA

1 - Todos os anos, em Novembro, os Portugueses do chamado "Cone Sul" (da América) encontram-se num dos três países que o formam, Brasil, Argentina e Uruguai.  O grande Encontro nasceu à volta de um campeonato do popular jogo da sueca, que, praticamente desde o início, se foi alargando a outras formas de convívio interassociativo - exposições, desfile e exibição de ranchos folclóricos, palestras, debates, conferências... Na verdade, a componente puramente lúdica com que começou por se apresentar e por ganhar o seu público, rapidamente cedeu a um marcante perfil cívico e cultural, com a participação de personalidades de relevo dos países co-envolvidos - membros do Governo, Deputados, Diplomatas, Autarcas, Conselheiros das Comunidades, dirigentes das instituições comunitárias, especialistas das temáticas em análise, escritores, artistas plásticos....
A 29ª edição decorreu nas margens do Rio da Prata, na famosa Colónia de Sacramento, fundada por Manuel Lobo, ido do Rio de Janeiro, por largo tempo, território de reino português e hoje "património da Humanidade", na sua belíssima traça antiga. Sem o imenso Prata à vista, poderíamos julgar que estávamos no centro de uma vila transmontana, milagrosamente preservada, através dos séculos.
A qualidade da sua reconstrução, em data recente, fica a dever-se, sobretudo, a um notável historiador luso-uruguaio, o Prof Fernando Assunção, com quem em 1980 visitei a cidade, ainda á espera  da finalização das obras que a colocaram no mapa da UNESCO.
  
2 - Num outro país de emigração, este Encontro seria apenas importante. No nosso caso, é mais do que isso: é único! É um paradigma de internacionalização  inédito no panorama do associativismo português.
De facto, ao contrário do que acontece nos demais países europeus. o associativismo português é muito forte, a nível de cada cidade, ou região, ou país, mas nunca ultrapassa esta última fronteira.
A proliferação de organizações mundiais de emigrantes deu-se em inícios do século XX, num tempo em que os europeus procuravam, em massa, nova vida na América, de norte a sul. Exemplos: a Organização dos Suíços no Estrangeiro, (que ainda hoje dá mostras de extraordinária vitalidade, reunindo anualmente, em congresso, mais de um milhar de emigrados e elegendo, entre eles, o mais antigo dos "Conselhos" das Diáspora europeias: a "Associação Mundial dos Austríacos no Estrangeiro"; os "Flamengos no Mundo" e a "União Francófona dos Belgas no Estrangeiro": a "Associação de Cultura Alemã no Estrangeiro": a Fundação dos Espanhóis no Mundo": a "Associação para os Direitos dos Ingleses": a "União dos Italianos no Estrangeiro": a " Suécia no Mundo" e a "Associação Educativa das Mulheres Suecas": a "União dos Franceses no Estrangeiro", a primeira a reclamar, desde 1927, a representação política dos expatriados, (que está na origem da instituição, em 1948, do "Conselho Superior dos Franceses do Estrangeiro", atualmente "Assembleia dos Franceses do Estrangeiro" - órgão de consulta governamental, em que se inspiraram, na década de 80, os "Conselhos" de todos os outros países europeus, incluindo o nosso). A última  é "Comunidade Polaca", constituída em 1991, pouco depois da dissolução da URSS.
É paradoxal ver o Povo que, na sua dispersão planetária, corporizou o primeiro movimento de globalização dar, assim, mostras de incapacidade de unificar institucionalmente um movimento associativo pujante, mas fechado sobre si - como uma infinidade de ilhas que querem sempre fazer ponte com o País, mas não entre si.
Houve uma tentativa, tardia embora, de alterar este estado de coisas - nos anos sessenta, com  a criação da "União das Comunidades de Cultura Portuguesa", por iniciativa de Adriano Moreira, então presidente da Sociedade de Geografia, O regime não a deixaria sequer passar da proclamação formal, num grande Congresso mundial,  para a ação concreta.
De qualquer modo, note-se, era de dentro do país e não da própria Diáspora que o clarividente projeto nascia...Depois, no princípio de oitenta, foi o governo a propor uma ideia de federalização associativa a partir do Conselho das Comunidades. Também não resultou. O Conselho continua, mas como mero órgão consultivo governamental, onde há dirigentes de coletividades dos cinco continrentes, eleitos a título individual..

3 - Neste novembro de 2017, houve uma razão muito especial para reunir no Uruguai o atual Secretário de Estado, José Luís Carneiro e dois dos seus antecessores, José Cesário e eu mesma: O Encontro era dedicado a José Lello, 
que ocupou esse cargo, de uma forma memorável, nos anos noventa e começo do século XXI. Foi depois Ministro do Desporto e deputado, sem nunca esquecer e, como se viu em Sacramento, sem ser esquecido pelo mundo da emigração. Foi o único titular da pasta, que anos depois de cessar funções procurou lançar uma Fundação para o diálogo no espaço lusófono (Terra Mater) e convidou-me a partllhar com ele o empreendimento. Aceitei sem pensar duas vezes, porque  para mim José Lello, tendo sido, episodicamente, um adversário político, se convertera num amigo verdadeiro -  e para sempre. O que nos dividiu, numa fase encerrada foram questões menores. No essencial, tínhamos a mesma visão da Diáspora e da urgência de a unir em volta de valores culturais. Por isso, não hesitei em fazer tantos milhares de quilómetros para o lembrar, numa sentida  homenagem, com a presença do seu filho Miguel, entre muitas centenas de Portugueses de países distantes. (a homenagem que faltou no Portugal do território...).

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